O
processo de independência do Brasil foi acelerado pela mobilização da elite
local em torno de dom Pedro. Contudo, os oficiais das províncias do Grão-Pará,
do Maranhão, do Piauí, da Bahia e da Cisplatina – atual Uruguai –, que eram alinhados
às Cortes de Lisboa, resistiram à ideia de rompimento com Portugal. Foi dentro
desse quadro que ocorreram combates entre o exército português e os
brasileiros.
No
intuito de controlar as regiões rebeladas e vencer as forças portuguesas, dom
Pedro I contratou navios estrangeiros e mercenários. A tomada de Salvador e a
incorporação da Bahia ao Brasil independente ocorreram apenas em 2 de julho de
1823. O Maranhão foi integrado ao Império Brasileiro em agosto, o Grão-Pará em
outubro, e a Cisplatina, por sua vez, em novembro de 1823.
No
âmbito da Doutrina Monroe, que defendia a autonomia das novas nações do
continente americano, os Estados Unidos foram o primeiro país a reconhecer a
independência brasileira. A Inglaterra reconheceu a independência do Brasil em
1825, época em que o nosso país representava o terceiro maior mercado externo
para os produtos ingleses. A Inglaterra interveio nas negociações entre Brasil
e Portugal, financiando a quantia de 2 milhões de libras esterlinas que o
Brasil pagou a Portugal a título de indenização. O dinheiro não chegou a sair
de Londres, pois os ingleses trataram logo de cobrar de Portugal uma dívida no
mesmo valor. A ação mediadora dos britânicos permitiu-lhes reafirmar, em 1827,
os tratados de 1810 que garantiam tarifas aduaneiras reduzidas pagas pelos
produtos ingleses que chegavam ao Brasil.
O
baixo preço dos produtos importados, em especial os britânicos, representava
uma concorrência que desestimulava a produção industrial interna, gerando um
crescente déficit no comércio internacional do Brasil. Tal situação obrigava o
Brasil a fazer constantes empréstimos, o que aumentava a sua dependência
econômica em relação à Inglaterra.
A
Assembleia Constituinte
Cem
deputados eleitos por voto censitário e indireto reuniram-se em maio de 1823
para formar a Assembleia Constituinte que seria responsável pela elaboração da
Constituição do Império Brasileiro. O grupo dos constituintes era formado por
latifundiários, grandes comerciantes, juízes, médicos, militares e representantes
da Igreja católica. Boa parte desses deputados defendia o estabelecimento de
uma monarquia constitucional que garantisse os direitos individuais e limitasse
os poderes do imperador, sem, contudo, promover alterações estruturais que
afetassem o domínio aristocrático-escravista ou que dessem origem a um regime
amplamente democrático.
Antônio
Carlos de Andrada e Silva, irmão de José Bonifácio, redigiu o projeto de
Constituição. Antônio Carlos era conservador, porém, foi apoiado pelo Partido
Brasileiro, que defendia a soberania do Legislativo sobre o imperador e as
forças armadas. O texto de tal projeto determinava que o Poder Executivo –
representado pelo imperador – não poderia vetar completamente uma lei aprovada
pela Câmara dos Deputados, ou dissolvê-la. O imperador era ainda proibido de
ser rei em outro país. O projeto constitucional de Antônio Carlos ficou
conhecido como a “Constituição da Mandioca”, pois estabelecia o voto censitário
ao exigir uma renda superior ao equivalente a 150 alqueires de mandioca de quem
quisesse participar da vida política.
Por
sua vez, militares de alta patente, funcionários públicos e comerciantes, quase
todos portugueses, formaram o Partido Português, que era contrário ao projeto
de Antônio Carlos e defendia a monarquia absolutista. Apoiado por este grupo
político, dom Pedro I rejeitou as propostas do referido projeto e dissolveu a
Assembleia Constituinte.
O
imperador reuniu um Conselho de Estado formado por dez pessoas de sua confiança
e, a partir disso, uma Constituição foi elaborada. Em 1824, dom Pedro I
outorgou a primeira Carta Constitucional do Brasil. O documento estabelecia a
monarquia hereditária, a divisão político-administrativa do território em
províncias e a separação do poder em quadros ramos: Executivo (imperador e
ministros de Estado), Legislativo (Câmara dos Deputados e Senado), Judiciário
(juízes e tribunais) e Moderador (atribuição exclusiva do imperador, que
regularia os outros três poderes). Por meio do poder Moderador, dom Pedro I
podia dissolver a Câmara dos Deputados quando quisesse convocar novas eleições,
nomear senadores, aprovar ou vetar as decisões da Câmara e do Senado, nomear e
destituir os presidentes de província, etc.
O
Senado seria formado por senadores escolhidos pelo imperador em uma lista
tríplice de pessoas eleitas e com mandato vitalício, enquanto que a Câmara dos
Deputados contaria com parlamentares com mandato temporário (quatro anos). As
eleições eram indiretas e censitárias, sendo que, para tornar-se senador, por
exemplo, era preciso comprovar uma renda anual mínima de 800 mil-réis. Os
“eleitores de paróquia” deveriam ter uma renda de 100 mil-réis/ano para
escolher os “eleitores de província”, que deveriam ter uma renda de 200
mil-réis/ano para estarem aptos a votar nos deputados e senadores. Os
candidatos a deputado deveriam ter uma renda de 400 mil-réis/ano.
A
carta constitucional de 1824 considerava cidadãos todos os homens livres
nascidos nos Brasil ou naturalizados brasileiros, com igual acesso aos direitos
civis. Assim, os cidadãos foram classificados em três grupos: os “cidadãos
passivos” não tinham renda suficiente para ter direitos políticos, os “cidadãos
ativos votantes” tinham renda suficiente para votar, mas não para se
candidatar, e, enfim, os “cidadãos ativos eleitores elegíveis”, que tinham
renda para votar e ser eleitos.
A
Constituição oficializou a religião católica e subordinou a Igreja ao Estado,
sendo que os membros do clero eram considerados funcionários públicos. Enfim, a
Carta restringia ou impedia a participação política de grupos sociais menos
favorecidos.
Embora
afirmasse a igualdade de direitos civis a todos os cidadãos, ao longo de todo o
período em que vigorou a Constituição de 1824 o exercício cotidiano da
cidadania quase nunca foi o mesmo entre brancos e negros, ricos e pobres,
devido às influências, fraudes, pressões, etc.
A
Confederação do Equador
Diante
do quadro de centralização política e autoritarismo instalado pela Constituição
de 1824, um movimento contrário ao poder de dom Pedro I ocorreu a partir da
província de Pernambuco. É preciso lembrar que, ainda durante o governo de dom
João VI, em 1817, os liberais pernambucanos tentaram emancipar a província e
proclamar uma República. Com a independência do Brasil, os ideais republicanos
reacenderam-se, mas foram frustrados pelo caráter autoritário da Constituição.
Ademais,
naquela região, havia uma intensa rivalidade entre portugueses e brasileiros,
estimulada pela cobrança de dívidas antigas por parte dos comerciantes
portugueses, que exigiam dos devedores brasileiros a entrega de bens, como
escravizados e terras. Havia ainda um temor de que as províncias do norte e do
nordeste do Brasil perdessem influência diante do crescimento do poder político
e econômico das províncias do sul e do sudeste. O clima de animosidade na
província de Pernambuco aumentou ainda mais quando Francisco Pais Barreto, fiel
aliado de dom Pedro I, tornou-se presidente da província.
Os
liberais Manuel de Carvalho Pais de Andrade, Frei Joaquim do Amor Divino Caneca
e Cipriano Barata, este último um médico e filósofo preocupado com questões
políticas e sociais como a abolição da escravidão, lideraram o movimento.
A
revolta começou com a exigência de que o presidente da província, Francisco
Pais Barreto, nomeado por dom Pedro I, renunciasse ao cargo diante da oposição
que sofria em Pernambuco. Para o seu lugar, os liberais escolheram Manuel de
Carvalho Pais de Andrade. A marinha imperial cercou a cidade do Recife por três
meses, mas os rebeldes resistiram e, no dia 2 julho de 1824, Pais de Andrade
proclamou a Confederação do Equador, que uniu as províncias de Pernambuco,
Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte em torno da causa republicana e pelo fim
do tráfico de escravizados.
O
movimento se inspirava nos ideais de federação que serviram de base para a
organização dos Estados Unidos da América. Contudo, parte da população das
províncias não apoiou o movimento separatista liderado por Pais de Andrade.
Houve ainda conflitos internos e a divisão nas forças militares.
A
imprensa liberal fazia propaganda pró-República e tentava trazer a população
para o seu lado, por meio de jornais como o “Sentinela da Liberdade”, de
Cipriano Barata, o “Typhis Pernambucano”, de Frei Caneca, e o “Desengano
Pernambucano”, de João Soares Lisboa, que davam as últimas notícias sobre a
Confederação do Equador e faziam a propaganda política do movimento
separatista.
Dom
Pedro I nomeou o brigadeiro Francisco de Lima e Silva para comandar a repressão
ao movimento. O brigadeiro seria auxiliado no mar pelo almirante inglês Thomas
Cochrane. Os rebeldes resistiram por quase quatro meses, mas, acabaram se
entregando. Frei Caneca, o major negro Agostinho Bezerra e outros rebeldes
foram condenados à morte; os demais foram anistiados. Dom
Pedro I ordenou que a Confederação fosse colocada em “perpétuo silêncio”.
Impopularidade
e abdicação de dom Pedro I
Após
a dissolução da Assembleia Constituinte, a imposição da Constituição de 1824 e
a repressão violenta à Confederação do Equador, a popularidade de dom Pedro I
ficou abalada. No campo econômico, a balança comercial deficitária e o aumento
da dívida externa, em decorrência dos constantes empréstimos, fragilizaram a
economia brasileira. Os elevados gastos com a organização do Estado e a
inexistência de uma significativa fonte nacional de recursos levaram dom Pedro
I a autorizar várias emissões de dinheiro, o que desvalorizou a moeda e
provocou inflação. Em 1829 foi decretada a falência do Banco do Brasil.
Neste
período, ocorreu ainda a morte de dom João VI em Portugal, no ano de 1826. Dom
Pedro I era o herdeiro natural do trono português, mas sabia que não poderia
ser imperador do Brasil e rei de Portugal ao mesmo tempo, tendo em vista o
receio dos brasileiros de que o Brasil retornasse à condição de colônia. Dom
Pedro I abdicou do trono português em favor de sua filha, Maria da Glória, de
apenas 7 anos de idade, e articulou o casamento da menina com seu irmão,
Miguel. Todavia, dom Miguel recusou o acordo e tomou o poder. Dom Pedro I
gastou enormes somas de dinheiro no envio de navios e tropas para combater dom
Miguel e reconduzir sua filha ao trono. Maria da Glória até foi enviada à
Europa, em uma ação que pretendia defender seus direitos ao trono.
Na
região sul do Império Brasileiro, após a expulsão dos militares portugueses da
Cisplatina, em 1823, os uruguaios iniciaram um movimento por sua independência.
Interessada em anexar a região e controlar a navegação na bacia do rio da
Prata, a Argentina apoiou os uruguaios em sua luta. Em 1825 teve início a Guerra
da Cisplatina, e o governo brasileiro fez um empréstimo com os ingleses para
contratar tropas mercenárias e comprar armas e provisões. Em 1828, com um
tratado assinado no fim da Guerra, a província Cisplatina tornou-se um país
independente, o Uruguai.
Em
razão da influência do Partido Português no governo, a aversão aos portugueses
só fez aumentar. Dom Pedro I tinha nos integrantes do Partido Português os seus
únicos aliados, e em troca desse apoio concedia-lhes favores e privilégios. Boa
parte da população criticava a intervenção dos “corcundas” – termo utilizado
pelos brasileiros da época para se referirem aos partidários do absolutismo –
na política brasileira.
Dom
Pedro I, que perdia popularidade em meio aos acontecimentos recentes – gastos
na disputa pelo trono português, derrota na Guerra da Cisplatina e crescimento
do sentimento antilusitano na população brasileira –, passou a ser alvo de
críticas por parte da imprensa. Uma grave crise política se instalou a partir
de 1830 quando o jornalista Líbero Badaró, feroz crítico do autoritarismo do
imperador, foi assassinado em São Paulo por aliados políticos do imperador.
O
imperador viajou para Minas Gerais e, na cidade de Ouro Preto, deparou-se com
portas e janelas fechadas ostentando panos pretos e o soar de sinos em sinal de
luto pela morte de Badaró. De volta ao Rio de Janeiro, o imperador foi recebido
por simpatizantes, em sua maioria portugueses, e o resultado foi o início de um
conflito de rua – a “Noite das Garrafadas” – que se estendeu por três dias.
Dom
Pedro I trocou o ministério e colocou em seu lugar um outro formado apenas por
brasileiros, mas as manifestações de insatisfação continuaram. A partir disso,
o monarca trocou novamente o ministério, escolhendo agora apenas ministros
“corcundas” para o chamado “Ministério dos Marqueses”. Milhares de pessoas
saíram às ruas pedindo o retorno do “Ministério dos Brasileiros”, mas dom Pedro
I enviou tropas do exército para reprimir as manifestações.
Todavia,
a tentativa de repressão por parte do imperador fracassaria. No seio do próprio
exército havia um clima de revolta, pois os oficiais brasileiros ocupavam
cargos inferiores aos dos portugueses, e as tropas formadas por brancos e
mulatos pobres sofriam com os baixos soldos (que quase sempre chegavam
atrasados). Assim, em vez de sufocar a revolta, o exército apoiou os populares.
No
dia 7 de abril de 1831, dom Pedro I acabou abdicando do trono brasileiro em
favor de seu filho, Pedro de Alcântara, de apenas cinco anos de idade. Após a
abdicação, dom Pedro I retornou a Portugal, onde enfrentou e venceu seu irmão
dom Miguel, tornando-se o novo monarca português com o título de Pedro IV. Em
1834 abdicou novamente do trono português em favor de sua filha, dona Maria da
Glória.