Sobre o "Blog do Super Rodrigão"

*** O "Blog do Super Rodrigão" foi criado e editado por Rodrigo Francisco Dias quando de sua passagem como professor de História da Escola Estadual Messias Pedreiro (Uberlândia-MG). O Blog esteve ativo entre os anos de 2013 e 2018, mas as suas atividades foram encerradas no dia 27/08/2018, após o professor Rodrigo deixar a E. E. Messias Pedreiro. ***

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

O Primeiro Reinado no Brasil

O processo de independência do Brasil foi acelerado pela mobilização da elite local em torno de dom Pedro. Contudo, os oficiais das províncias do Grão-Pará, do Maranhão, do Piauí, da Bahia e da Cisplatina – atual Uruguai –, que eram alinhados às Cortes de Lisboa, resistiram à ideia de rompimento com Portugal. Foi dentro desse quadro que ocorreram combates entre o exército português e os brasileiros.

No intuito de controlar as regiões rebeladas e vencer as forças portuguesas, dom Pedro I contratou navios estrangeiros e mercenários. A tomada de Salvador e a incorporação da Bahia ao Brasil independente ocorreram apenas em 2 de julho de 1823. O Maranhão foi integrado ao Império Brasileiro em agosto, o Grão-Pará em outubro, e a Cisplatina, por sua vez, em novembro de 1823.

No âmbito da Doutrina Monroe, que defendia a autonomia das novas nações do continente americano, os Estados Unidos foram o primeiro país a reconhecer a independência brasileira. A Inglaterra reconheceu a independência do Brasil em 1825, época em que o nosso país representava o terceiro maior mercado externo para os produtos ingleses. A Inglaterra interveio nas negociações entre Brasil e Portugal, financiando a quantia de 2 milhões de libras esterlinas que o Brasil pagou a Portugal a título de indenização. O dinheiro não chegou a sair de Londres, pois os ingleses trataram logo de cobrar de Portugal uma dívida no mesmo valor. A ação mediadora dos britânicos permitiu-lhes reafirmar, em 1827, os tratados de 1810 que garantiam tarifas aduaneiras reduzidas pagas pelos produtos ingleses que chegavam ao Brasil.

O baixo preço dos produtos importados, em especial os britânicos, representava uma concorrência que desestimulava a produção industrial interna, gerando um crescente déficit no comércio internacional do Brasil. Tal situação obrigava o Brasil a fazer constantes empréstimos, o que aumentava a sua dependência econômica em relação à Inglaterra.



A Assembleia Constituinte

Cem deputados eleitos por voto censitário e indireto reuniram-se em maio de 1823 para formar a Assembleia Constituinte que seria responsável pela elaboração da Constituição do Império Brasileiro. O grupo dos constituintes era formado por latifundiários, grandes comerciantes, juízes, médicos, militares e representantes da Igreja católica. Boa parte desses deputados defendia o estabelecimento de uma monarquia constitucional que garantisse os direitos individuais e limitasse os poderes do imperador, sem, contudo, promover alterações estruturais que afetassem o domínio aristocrático-escravista ou que dessem origem a um regime amplamente democrático.

Antônio Carlos de Andrada e Silva, irmão de José Bonifácio, redigiu o projeto de Constituição. Antônio Carlos era conservador, porém, foi apoiado pelo Partido Brasileiro, que defendia a soberania do Legislativo sobre o imperador e as forças armadas. O texto de tal projeto determinava que o Poder Executivo – representado pelo imperador – não poderia vetar completamente uma lei aprovada pela Câmara dos Deputados, ou dissolvê-la. O imperador era ainda proibido de ser rei em outro país. O projeto constitucional de Antônio Carlos ficou conhecido como a “Constituição da Mandioca”, pois estabelecia o voto censitário ao exigir uma renda superior ao equivalente a 150 alqueires de mandioca de quem quisesse participar da vida política.

Por sua vez, militares de alta patente, funcionários públicos e comerciantes, quase todos portugueses, formaram o Partido Português, que era contrário ao projeto de Antônio Carlos e defendia a monarquia absolutista. Apoiado por este grupo político, dom Pedro I rejeitou as propostas do referido projeto e dissolveu a Assembleia Constituinte.

O imperador reuniu um Conselho de Estado formado por dez pessoas de sua confiança e, a partir disso, uma Constituição foi elaborada. Em 1824, dom Pedro I outorgou a primeira Carta Constitucional do Brasil. O documento estabelecia a monarquia hereditária, a divisão político-administrativa do território em províncias e a separação do poder em quadros ramos: Executivo (imperador e ministros de Estado), Legislativo (Câmara dos Deputados e Senado), Judiciário (juízes e tribunais) e Moderador (atribuição exclusiva do imperador, que regularia os outros três poderes). Por meio do poder Moderador, dom Pedro I podia dissolver a Câmara dos Deputados quando quisesse convocar novas eleições, nomear senadores, aprovar ou vetar as decisões da Câmara e do Senado, nomear e destituir os presidentes de província, etc.

O Senado seria formado por senadores escolhidos pelo imperador em uma lista tríplice de pessoas eleitas e com mandato vitalício, enquanto que a Câmara dos Deputados contaria com parlamentares com mandato temporário (quatro anos). As eleições eram indiretas e censitárias, sendo que, para tornar-se senador, por exemplo, era preciso comprovar uma renda anual mínima de 800 mil-réis. Os “eleitores de paróquia” deveriam ter uma renda de 100 mil-réis/ano para escolher os “eleitores de província”, que deveriam ter uma renda de 200 mil-réis/ano para estarem aptos a votar nos deputados e senadores. Os candidatos a deputado deveriam ter uma renda de 400 mil-réis/ano.

A carta constitucional de 1824 considerava cidadãos todos os homens livres nascidos nos Brasil ou naturalizados brasileiros, com igual acesso aos direitos civis. Assim, os cidadãos foram classificados em três grupos: os “cidadãos passivos” não tinham renda suficiente para ter direitos políticos, os “cidadãos ativos votantes” tinham renda suficiente para votar, mas não para se candidatar, e, enfim, os “cidadãos ativos eleitores elegíveis”, que tinham renda para votar e ser eleitos.

A Constituição oficializou a religião católica e subordinou a Igreja ao Estado, sendo que os membros do clero eram considerados funcionários públicos. Enfim, a Carta restringia ou impedia a participação política de grupos sociais menos favorecidos.

Embora afirmasse a igualdade de direitos civis a todos os cidadãos, ao longo de todo o período em que vigorou a Constituição de 1824 o exercício cotidiano da cidadania quase nunca foi o mesmo entre brancos e negros, ricos e pobres, devido às influências, fraudes, pressões, etc.


A Confederação do Equador

Diante do quadro de centralização política e autoritarismo instalado pela Constituição de 1824, um movimento contrário ao poder de dom Pedro I ocorreu a partir da província de Pernambuco. É preciso lembrar que, ainda durante o governo de dom João VI, em 1817, os liberais pernambucanos tentaram emancipar a província e proclamar uma República. Com a independência do Brasil, os ideais republicanos reacenderam-se, mas foram frustrados pelo caráter autoritário da Constituição.

Ademais, naquela região, havia uma intensa rivalidade entre portugueses e brasileiros, estimulada pela cobrança de dívidas antigas por parte dos comerciantes portugueses, que exigiam dos devedores brasileiros a entrega de bens, como escravizados e terras. Havia ainda um temor de que as províncias do norte e do nordeste do Brasil perdessem influência diante do crescimento do poder político e econômico das províncias do sul e do sudeste. O clima de animosidade na província de Pernambuco aumentou ainda mais quando Francisco Pais Barreto, fiel aliado de dom Pedro I, tornou-se presidente da província.

Os liberais Manuel de Carvalho Pais de Andrade, Frei Joaquim do Amor Divino Caneca e Cipriano Barata, este último um médico e filósofo preocupado com questões políticas e sociais como a abolição da escravidão, lideraram o movimento.

A revolta começou com a exigência de que o presidente da província, Francisco Pais Barreto, nomeado por dom Pedro I, renunciasse ao cargo diante da oposição que sofria em Pernambuco. Para o seu lugar, os liberais escolheram Manuel de Carvalho Pais de Andrade. A marinha imperial cercou a cidade do Recife por três meses, mas os rebeldes resistiram e, no dia 2 julho de 1824, Pais de Andrade proclamou a Confederação do Equador, que uniu as províncias de Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte em torno da causa republicana e pelo fim do tráfico de escravizados.

O movimento se inspirava nos ideais de federação que serviram de base para a organização dos Estados Unidos da América. Contudo, parte da população das províncias não apoiou o movimento separatista liderado por Pais de Andrade. Houve ainda conflitos internos e a divisão nas forças militares.

A imprensa liberal fazia propaganda pró-República e tentava trazer a população para o seu lado, por meio de jornais como o “Sentinela da Liberdade”, de Cipriano Barata, o “Typhis Pernambucano”, de Frei Caneca, e o “Desengano Pernambucano”, de João Soares Lisboa, que davam as últimas notícias sobre a Confederação do Equador e faziam a propaganda política do movimento separatista.

Dom Pedro I nomeou o brigadeiro Francisco de Lima e Silva para comandar a repressão ao movimento. O brigadeiro seria auxiliado no mar pelo almirante inglês Thomas Cochrane. Os rebeldes resistiram por quase quatro meses, mas, acabaram se entregando. Frei Caneca, o major negro Agostinho Bezerra e outros rebeldes foram condenados à morte; os demais foram anistiados. Dom Pedro I ordenou que a Confederação fosse colocada em “perpétuo silêncio”.


Impopularidade e abdicação de dom Pedro I

Após a dissolução da Assembleia Constituinte, a imposição da Constituição de 1824 e a repressão violenta à Confederação do Equador, a popularidade de dom Pedro I ficou abalada. No campo econômico, a balança comercial deficitária e o aumento da dívida externa, em decorrência dos constantes empréstimos, fragilizaram a economia brasileira. Os elevados gastos com a organização do Estado e a inexistência de uma significativa fonte nacional de recursos levaram dom Pedro I a autorizar várias emissões de dinheiro, o que desvalorizou a moeda e provocou inflação. Em 1829 foi decretada a falência do Banco do Brasil.

Neste período, ocorreu ainda a morte de dom João VI em Portugal, no ano de 1826. Dom Pedro I era o herdeiro natural do trono português, mas sabia que não poderia ser imperador do Brasil e rei de Portugal ao mesmo tempo, tendo em vista o receio dos brasileiros de que o Brasil retornasse à condição de colônia. Dom Pedro I abdicou do trono português em favor de sua filha, Maria da Glória, de apenas 7 anos de idade, e articulou o casamento da menina com seu irmão, Miguel. Todavia, dom Miguel recusou o acordo e tomou o poder. Dom Pedro I gastou enormes somas de dinheiro no envio de navios e tropas para combater dom Miguel e reconduzir sua filha ao trono. Maria da Glória até foi enviada à Europa, em uma ação que pretendia defender seus direitos ao trono.

Na região sul do Império Brasileiro, após a expulsão dos militares portugueses da Cisplatina, em 1823, os uruguaios iniciaram um movimento por sua independência. Interessada em anexar a região e controlar a navegação na bacia do rio da Prata, a Argentina apoiou os uruguaios em sua luta. Em 1825 teve início a Guerra da Cisplatina, e o governo brasileiro fez um empréstimo com os ingleses para contratar tropas mercenárias e comprar armas e provisões. Em 1828, com um tratado assinado no fim da Guerra, a província Cisplatina tornou-se um país independente, o Uruguai.

Em razão da influência do Partido Português no governo, a aversão aos portugueses só fez aumentar. Dom Pedro I tinha nos integrantes do Partido Português os seus únicos aliados, e em troca desse apoio concedia-lhes favores e privilégios. Boa parte da população criticava a intervenção dos “corcundas” – termo utilizado pelos brasileiros da época para se referirem aos partidários do absolutismo – na política brasileira.

Dom Pedro I, que perdia popularidade em meio aos acontecimentos recentes – gastos na disputa pelo trono português, derrota na Guerra da Cisplatina e crescimento do sentimento antilusitano na população brasileira –, passou a ser alvo de críticas por parte da imprensa. Uma grave crise política se instalou a partir de 1830 quando o jornalista Líbero Badaró, feroz crítico do autoritarismo do imperador, foi assassinado em São Paulo por aliados políticos do imperador.

O imperador viajou para Minas Gerais e, na cidade de Ouro Preto, deparou-se com portas e janelas fechadas ostentando panos pretos e o soar de sinos em sinal de luto pela morte de Badaró. De volta ao Rio de Janeiro, o imperador foi recebido por simpatizantes, em sua maioria portugueses, e o resultado foi o início de um conflito de rua – a “Noite das Garrafadas” – que se estendeu por três dias.

Dom Pedro I trocou o ministério e colocou em seu lugar um outro formado apenas por brasileiros, mas as manifestações de insatisfação continuaram. A partir disso, o monarca trocou novamente o ministério, escolhendo agora apenas ministros “corcundas” para o chamado “Ministério dos Marqueses”. Milhares de pessoas saíram às ruas pedindo o retorno do “Ministério dos Brasileiros”, mas dom Pedro I enviou tropas do exército para reprimir as manifestações.

Todavia, a tentativa de repressão por parte do imperador fracassaria. No seio do próprio exército havia um clima de revolta, pois os oficiais brasileiros ocupavam cargos inferiores aos dos portugueses, e as tropas formadas por brancos e mulatos pobres sofriam com os baixos soldos (que quase sempre chegavam atrasados). Assim, em vez de sufocar a revolta, o exército apoiou os populares.

No dia 7 de abril de 1831, dom Pedro I acabou abdicando do trono brasileiro em favor de seu filho, Pedro de Alcântara, de apenas cinco anos de idade. Após a abdicação, dom Pedro I retornou a Portugal, onde enfrentou e venceu seu irmão dom Miguel, tornando-se o novo monarca português com o título de Pedro IV. Em 1834 abdicou novamente do trono português em favor de sua filha, dona Maria da Glória.