Sobre o "Blog do Super Rodrigão"

*** O "Blog do Super Rodrigão" foi criado e editado por Rodrigo Francisco Dias quando de sua passagem como professor de História da Escola Estadual Messias Pedreiro (Uberlândia-MG). O Blog esteve ativo entre os anos de 2013 e 2018, mas as suas atividades foram encerradas no dia 27/08/2018, após o professor Rodrigo deixar a E. E. Messias Pedreiro. ***

terça-feira, 30 de setembro de 2014

O Período Regencial

Após a abdicação de dom Pedro I houve uma nova composição entre os grupos políticos. O Partido Português passou a chamar-se Partido Restaurador, pois lutava pelo retorno de dom Pedro I ao trono brasileiro. Todavia, após a morte do ex-imperador em 1834, os “caramurus”, como também eram chamados os restauradores, acabariam unindo-se a alguns liberais moderados para formar o Partido Regressista.

Por sua vez, o Partido Brasileiro subdividiu-se entre liberais moderados (representantes dos proprietários de terra, principalmente de São Paulo e Minas Gerais) e liberais exaltados (representantes das classes médias e dos latifundiários gaúchos). Para os moderados era necessário restabelecer a ordem, acabar com os tumultos e obedecer à Constituição. Já os liberais exaltados lutavam por mais participação política, pela autonomia das províncias, pelo fim do Senado vitalício e do Poder Moderador e contra qualquer influência portuguesa no governo. Aos gritos de “mata português”, provocavam tumultos na capital do Império.

De acordo com a Constituição de 1824, em caso de morte ou abdicação do imperador, e havendo a impossibilidade de seu herdeiro assumir o trono por razões de menoridade, uma Junta de três regentes indicados pela Assembleia Geral (Câmara de Deputados e Senado) deveria governar o Império brasileiro até que o jovem príncipe completasse 18 anos de idade. Contudo, D. Pedro I abdicara do trono durante as férias parlamentares, o que obrigou deputados e senadores que estavam no Rio de Janeiro a se reunirem de forma extraordinária e a formarem uma Regência Trina Provisória responsável por governar interinamente o Brasil. Formada por dois senadores – Nicolau Pereira de Campos Vergueiro e José Joaquim Carneiro de Campos – e pelo brigadeiro Francisco de Lima e Silva, a Regência Trina Provisória governou até o dia 17 de junho de 1831 e realizou algumas medidas como readmitir o “ministério dos brasileiros”, deposto por dom Pedro I, anistiar os prisioneiros políticos, suspender temporariamente o exercício do Poder Moderador e convocar eleições para a escolha de uma Regência Permanente.

A Assembleia Geral elegeu a Regência Trina Permanente, sendo escolhidos os deputados João Bráulio Muniz, representando as províncias do Norte, e José da Costa Carvalho, pelas do Sul. Muniz e Carvalho eram ligados aos liberais moderados. Por sua vez, o terceiro nome da Regência era o do brigadeiro Francisco de Lima e Silva.

Sob o pretexto de manter a paz interna houve a proibição de ajuntamentos noturnos nas praças e ruas e a suspensão de algumas garantias constitucionais. Em agosto de 1831, o ministro da Justiça, padre Diogo Antônio Feijó, um liberal moderado, extinguiu as guardas municipais e criou a Guarda Nacional, uma organização paramilitar constituída por milícias civis e encarregada de defender a Constituição e garantir a ordem interna. Como eram organizadas localmente, tais milícias fortaleceram o poder dos grandes proprietários rurais, porque, embora sua função fosse semelhante à do Exército, os seus membros eram civis – era preciso ser um cidadão brasileiro com idade entre 21 e 60 anos e renda anual superior a 200 mil-réis para fazer parte da Guarda – e seus oficiais, pessoas indicadas pelos chefes políticos locais. Tais chefes normalmente eram donos de terra ou pessoas de sua confiança. O posto mais alto da Guarda era o de “coronel”, e foi daí que surgiu o termo “coronelismo” para designar um sistema de poder local presente em parte considerável da história do Brasil.

A criação da Guarda Nacional revela uma tendência de descentralização do poder durante aquele período. Seguindo essa mesma tendência, em novembro de 1832 foi aprovado o Código do Processo Criminal, que aumentou o poder dos juízes de paz nas cidades e nas vilas. Esse cargo do poder judiciário havia sido criado em 1827 e era ocupado por pessoas sem formação em Direito, cuja função era julgar pequenas causas locais. Com o novo código, os juízes de paz passavam a exercer o papel de polícia e juiz local: podiam prender criminosos, julgar, preparar as listas de votantes, presidir mesas eleitorais, ajudar a compor a lista dos jurados, convocar a Guarda Nacional, etc. O juiz de paz era eleito pela população, porém, como votavam apenas indivíduos livres do sexo masculino que possuíam bens, as pessoas escolhidas para o cargo representavam os interesses dos grandes proprietários de terras e de escravos. No intuito de ascender socialmente, muitos juízes de paz se rendiam aos poderosos que, com isso, evitavam a condenação de seus capangas e clientes.

Importante passo para a descentralização do poder foi a aprovação do Ato Adicional pela Assembleia Geral, em 1834. Por meio dessa reforma na Constituição era extinto o Conselho de Estado – cujos membros haviam sido nomeados por D. Pedro I – e criadas as Assembleias Legislativas provinciais. Órgãos do Poder Legislativo, as Assembleias tinham como função elaborar leis de interesse local e nomear funcionários públicos, permitindo assim a conquista de uma relativa autonomia para as províncias. Todavia, essa autonomia era limitada, pois cabia ao imperador nomear os presidentes provinciais, homens que detinham o poder de veto sobre as decisões da Assembleia. Além disso, tanto o Poder Moderador quanto o Senado vitalício foram mantidos. O Ato Adicional de 1834 criou ainda a Regência Una, que deveria substituir a Regência Trina Permanente, estabelecendo a eleição do regente por meio do voto censitário para um mandato de quatro anos.

As eleições para regente ocorreram em abril de 1835 e contaram com a participação de cerca de 6 mil eleitores (pouco mais de 0,1% da população, estimada em 5 milhões de pessoas). Venceu o ex-ministro da Justiça, padre Diogo Antônio Feijó, que assumiu a Regência Una em outubro de 1835, em meio a uma crise de grandes proporções na economia, com o preço do açúcar em declínio no mercado externo, somando-se a isso um clima de tensão política no Império, com o início de revoltas nas províncias.

Havia uma situação de guerra civil em algumas províncias, como no Pará, onde ocorreu a rebelião conhecida como Cabanagem (1835-1840), e no Rio Grande do Sul, com a chamada Guerra dos Farrapos (1835-1845). Sem base parlamentar que lhe garantisse sustentação e acusado de não reprimir com firmeza os levantes provinciais e de ser favorável ao casamento dos padres, Feijó renunciou à Regência em setembro de 1837. O ministro do Interior, o regressista Pedro de Araújo Lima, assumiu interinamente o cargo e, meses depois, o próprio Araújo Lima foi eleito regente. No intuito de devolver ao governo central o controle de todo o aparelho administrativo e judiciário, foi aprovada em maio de 1840 a Lei de Interpretação do Ato Adicional, que restringiu os poderes das Assembleias provinciais. A essa lei se seguiram o restabelecimento do Conselho de Estado e a reforma do Código do Processo Criminal, que limitou a autoridade dos juízes de paz e fortaleceu a dos juízes municipais, subordinados ao poder judiciário central. Tais medidas – assim como o período em que foram tomadas – ficaram conhecidas como “Regresso”.

Ainda durante a segunda metade da década de 1830, novas rebeliões eclodiram em diferentes províncias, somando-se à Cabanagem no Pará e à Guerra dos Farrapos, no Sul. Na Bahia, ocorreram a Revolta dos Malês (1835) e a Sabinada (1837-1838); no Maranhão, ocorreu a Balaiada (1838-1841). Foi nesse contexto que os liberais exaltados aliaram-se a uma parte dos moderados e formaram o Partido Progressista, que defendia a autonomia das províncias e a descentralização política, e os antigos restauradores aliaram-se à outra parte dos liberais moderados e formaram o Partido Regressista, que defendia a restauração da ordem e o fortalecimento do poder central.

Os debates entre regressistas e progressistas eram intensos na capital do país. Insatisfeitos com o seu afastamento do poder desde a renúncia de Feijó, que era um liberal, os progressistas – que passaram a ser chamados de Partido Liberal – começaram a exigir a antecipação da maioridade do príncipe Pedro de Alcântara, que de acordo com a Constituição só poderia assumir o trono em 1844. Segundo os liberais, essa seria a melhor forma de fazer o país voltar à normalidade e garantir a unidade do Império.

Por sua vez, os regressistas – reunidos agora no Partido Conservador – opunham-se a tal medida, pois temiam ser afastados do poder com a antecipação da maioridade. Para estes sujeitos, a solução da crise estava na maior concentração de poderes nas mãos do governo regencial.

Em meio a tal debate, formou-se em abril de 1840 o chamado Clube da Maioridade, cuja presidência foi entregue ao liberal Antônio Carlos de Andrada e Silva, irmão de José Bonifácio. A campanha foi às ruas, com a distribuição de panfletos e a criação de quadrinhas defendendo a maioridade do jovem príncipe. O próprio Pedro de Alcântara apoiava a proposta.


Após intensas discussões, no dia 23 de julho de 1840 a Câmara e o Senado aprovaram o projeto liberal, concedendo a maioridade a dom Pedro de Alcântara, então com 14 anos de idade, e declarando-o imperador do Brasil como dom Pedro II. O episódio ficaria conhecido como Golpe da Maioridade. Logo no dia seguinte, um novo ministério, composto de representantes do Partido Liberal, seria organizado. Era o início de um reinado que iria se estender pelos 49 anos seguintes.