Sobre o "Blog do Super Rodrigão"

*** O "Blog do Super Rodrigão" foi criado e editado por Rodrigo Francisco Dias quando de sua passagem como professor de História da Escola Estadual Messias Pedreiro (Uberlândia-MG). O Blog esteve ativo entre os anos de 2013 e 2018, mas as suas atividades foram encerradas no dia 27/08/2018, após o professor Rodrigo deixar a E. E. Messias Pedreiro. ***

domingo, 15 de novembro de 2015

Sugestão de leitura: texto sobre a Revolta dos Boxers na China (1900)

A China sofreu com a ação imperialista de países europeus, dos Estados Unidos da América e também do Japão entre o final do século XIX e o início do século XX. De fato, nações estrangeiras buscavam explorar o território chinês de modo a expandir os seus lucros. Mas os chineses não aceitaram a presença imperialista em seu país de forma passiva. Um exemplo da resistência chinesa ao Imperialismo pode ser visto na Revolta dos Boxers, ocorrida em 1900.

A respeito deste assunto recomendamos a leitura de um pequeno texto de autoria de Stephanie Godiva e Fernando Falci, publicado no site da UFF. Para ler o texto, clique aqui.

Boa leitura!

Duas imagens para pensarmos sobre o Imperialismo...

Observe as imagens abaixo. O que há em comum entre as duas? Que diferenças você observa?

Imagem 1. Britânicos sendo carregados em liteiras.
Litogravura de William Hutton, 1820.

Imagem 2. Príncipe William, da Inglaterra, nas ilhas Salomão, em 2012.

A primeira foi feita em 1820, e representa britânicos sendo carregados em liteiras por habitantes da colônia da Costa do Ouro. 

A segunda é uma fotografia de setembro de 2012, tirada na cidade de Honiara, nas ilhas Salomão, um país localizado no oceano Pacífico. Ela retrata o príncipe William, da Inglaterra, sendo carregado, durante uma festa em comemoração aos 60 anos de coroação da rainha Elizabeth II.

Tanto a Costa do Ouro (atual Gana) quanto as ilhas Salomão foram regiões que, ao final do século XIX, foram dominadas pela Inglaterra e só conseguiram recuperar sua autonomia no século XX.

As duas imagens nos instigam a pensar sobre as diversas formas de Imperialismo ontem e hoje.

Uma charge sobre o imperialismo na China no século XIX

No século XIX, a China sofreu com a ação imperialista de vários países. O artista Henri Meyer retratou a sua visão sobre esse fato em uma charge publicada no ano de 1898 no periódico francês Le Petit Journal. Confira abaixo:

MEYER, H. The Chinese Cake. Le Petit Journal, jan. 1898. Charge

Na imagem, representantes de algumas potências imperialistas repartem fatias do que parece ser uma torta ou uma pizza, onde se lê "China". Sentados à mesa, da esquerda para a direita, vemos a rainha Vitória (representando a Inglaterra), o kaiser Guilherme II (Alemanha), o czar Nicolau II (Rússia) e o imperador Mutsuhito (Japão). Os três primeiros seguram facas, enquanto que o imperador japonês, sem portar uma faca, apenas observa a partilha com um olhar preocupado. Mutsuhito parece esperar "pelo que vai sobrar" da torta/pizza. Atrás do czar Nicolau II, a França é representada por uma mulher que usa na cabeça o "barrete frígio" - símbolo criado na época da Revolução Francesa -, e que também parece aguardar o processo de divisão da China. Ao fundo, a China é representada por um velho que ergue os braços em desespero e impotente diante da ação das potências imperialistas.

Nas palavras de Héctor Bruit,

"O imperialismo não só deixou um sabor amargo onde se instalou como também queimou com ácido e perfumou com enxofre três continentes. Chegou como um vendaval, destruindo sociedades milenares e construindo um mundo de angústias sobre as ruínas de milhões de seres humanos. [...] O efeito foi demolidor, e a fome assassinou milhões de pessoas." (BRUIT, H. O imperialismo. São Paulo: Atual, 1996, p. 58.)

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Ciência e Racismo

A penetração europeia na África e na Ásia ocorreu em uma época na qual muitos cientistas debatiam as teorias evolucionistas difundidas na Europa desde o início do século XIX e cujo ápice foi o livro A origem das espécies, do naturalista britânico Charles Darwin (1809-1882). Lançada em 1859, essa obra procurava explicar do ponto de vista da Ciência - e não da religião - como surgiram os seres vivos na Terra.

Segundo Darwin, todas as formas de vida na Terra descendem de um ancestral comum. A diversidade biológica do planeta seria fruto de um processo que em 1872 ele chamou de evolução. Em sua teoria, a evolução se manifesta de forma gradual por meio da seleção natural. Esta última faz que as espécies transmitam às gerações seguintes as características que aumentam suas possibilidades de sobrevivência, de modo a assegurar-lhes a existência. Já as características consideradas desvantajosas à sobrevivência da espécie teriam possibilidades mais reduzidas de serem transmitidas aos descendentes.

As ideias de Darwin e de outros evolucionistas da época foram aproveitadas por muitos cientistas e pensadores europeus para afirmar que a espécie humana era composta de várias raças.

Sendo assim, muitos passaram a defender a ideia de que as raças mais fortes e capazes sobreviveriam, enquanto que as raças mais fracas e incapazes seriam sucumbidas pela seleção natural e social. Segundo esses pensadores, os brancos, de modo geral, pertenceriam às raças mais capazes, ou seja, às raças "superiores", enquanto os não europeus pertenceriam às raças "inferiores". Alguns cientistas, como Ernst Haeckel (1834-1919), afirmavam que na base dessa escala encontravam-se os judeus e os negros.


Figura 1. Ilustração da obra Antropogenia ou História da evolução
do homem (1874), de Ernst Haeckel, que compara um homem negro
a alguns primatas. Imagens que se pretendiam "científicas" como essa
ajudaram na propagação do racismo.


Essas teorias foram amparadas no chamado "racismo científico". Elas serviram para justificar a colonização da África e da Ásia pelos europeus a partir do século XIX, uma vez que, aos olhos de muitos colonizadores, os habitantes desses continentes seriam seres inferiores, atrasados, preguiçosos e incivilizados. Ficava justificada, assim, a "missão civilizadora" dos europeus nesses continentes.

Durante o século XX, muitos trabalhos científicos mostraram o quanto havia de inconsistente nessas ideias. Os cientistas observaram que as diferenças das sequências genéticas entre dois indivíduos não chega a 1%.

As variações encontradas - como a cor da pele ou dos olhos, por exemplo - são resultado do processo evolutivo do ser humano diante da necessidade de se adaptar às condições ambientais em que passou a viver. Já as diferenças culturais decorrem dos processos histórico-sociais distintos de cada povo. Ou seja, a espécie humana é única.

(FONTE: AZEVEDO, Gislane; SERIACOPI, Reinaldo. História em movimento 2: o mundo moderno e a sociedade contemporânea. 2. ed. São Paulo: Ática, 2014, p. 240-241.)


A persistência do racismo na atualidade

Embora vários estudos nas últimas décadas tenham demonstrado que não existem raças diferentes de seres humanos, mas apenas uma única, o racismo teima em continuar existindo na atualidade. Episódios de manifestações racistas podem ser vivenciados em várias esferas da sociedade, mas nos últimos anos ganharam destaque alguns que ocorreram no futebol.

No dia 27 de abril de 2014, no jogo entre Barcelona e Villarreal - partida válida pelo Campeonato Espanhol -, o jogador brasileiro do Barça, Daniel Alves, foi alvo de ofensas racistas por parte da torcida adversária, que jogou bananas em sua direção. Daniel Alves, que se preparava para cobrar um escanteio, respondeu ao gesto da torcida rival de uma maneira inesperada: ele se abaixou, pegou uma das bananas e a comeu. O Barcelona venceu o Villarreal por 3 a 2.


Figura 2. Após a torcida do Villarreal atirar bananas em sua direção,
o jogador Daniel Alves, do Barcelona, abaixou-se e comeu uma delas.


Episódios como esse, infelizmente têm acontecido com frequência. No Brasil, um caso emblemático foi o do goleiro Aranha que, jogando pelo Santos, foi chamado de "macaco" por parte da torcida do Grêmio em uma partida do Campeonato Brasileiro de 2014.


Figura 3. Durante uma partida do Campeonato Brasileiro de 2014,
parte da torcida do Grêmio ofendeu de maneira racista o goleiro Aranha,
do Santos. Na imagem, torcedora do time gaúcho aparece
gritando "Macaco!" em direção ao goleiro do time adversário.


Mas afinal de contas, por que é tão grave chamar uma pessoa negra de "macaco"? Para responder a essa pergunta, recomendamos a leitura de um interessante texto de Hélton Santos Gomes, publicado no Jornal Correio de Uberlândia no dia 23 de maio de 2014:


SOMOS TODOS MACACOS?, por Hélton Santos Gomes*


Temos visto constantemente atos racistas contra jogadores negros pelos gramados europeus. A ofensa mais comum é comparar o negro com o macaco. Assim sendo, para que possamos entender o porquê do uso ofensivo da comparação de afrodescendentes com macacos teremos que recorrer à história, pois só assim entenderemos a força e o objetivo de tais insultos.

O antecessor de Charles Darwin, Jean-Baptiste de Lamarck (1744-1829), dizia que a evolução não se dava por meio da seleção natural, mas sim por meio de uma força vital que levava os organismos a se tornarem mais complexos, funcionando em combinação com a influência do ambiente. De acordo com esta ideia, os seres se encaminhariam para um melhoramento constante, rumo à perfeição. Portanto, os seres humanos não compartilhariam um ancestral em comum com os macacos, nós seríamos os descendentes diretos dos macacos e, por consequência disto, os africanos seriam o elo entre os macacos e os europeus. Em outras palavras, os não-europeus seriam mais macacos do que humanos.

As ideias de Lamarck contribuíram para o surgimento do racismo científico, este que acabou colaborando para que o europeu subjugasse outros povos. Basta lembrarmos que, em 1906, um pigmeu congolês chamado Ota Benga foi enjaulado junto com macacos e exibido em um zoológico na cidade de Nova Iorque, nos Estados Unidos. Tal exposição se deu com o intuito de demonstrar que Benga representava a forma mais baixa de desenvolvimento humano. Vale ressaltar que a teoria de Lamarck não é mais aceita e que Darwin jamais disse que os seres humanos descendem dos macacos.

Diante de tais fatos históricos, fica fácil compreender porque tais atos racistas são inadmissíveis e causam a revolta de quem os sofre. Pois, como disse o australiano James Bradley, professor de História da Medicina/Ciência da Vida da Universidade de Melbourne, “invocar a imagem do macaco é acessar o poder que levou a desapropriação das populações não europeias e outras heranças do colonialismo”.

Portanto, acreditamos que independentemente da postagem do jogador Neymar em seu Instagram com o uso da marcação #somostodosmacacos ter sido planejada por um publicitário e dar margem para interpretações ambíguas, o fato é que tal atitude serviu para alertar a sociedade sobre a importância de se debater sobre o preconceito, não só no esporte, mas também na sociedade em geral.

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* O título do texto de Hélton Santos Gomes faz referência a uma campanha iniciada pelo jogador brasileiro Neymar na internet, após o episódio de racismo sofrido pelo jogador Daniel Alves no dia 27 de abril de 2014. Em apoio ao amigo, Neymar postou uma mensagem em uma rede social com a marcação "#somostodosmacacos". Pouco depois, a imprensa revelou que o slogan havia sido desenvolvido por uma agência de publicidade.

terça-feira, 3 de novembro de 2015

A Europa no Século XIX

Tempo de revoluções

A Europa vivenciou várias revoltas e revoluções ao longo do século XIX em decorrência de diversas mudanças sociais, econômicas e políticas que ocorreram no período anterior. O Congresso de Viena buscou restaurar as monarquias europeias que haviam sido abaladas pelos acontecimentos relacionados à Revolução Francesa. Contra o autoritarismo e a repressão impostos pela restauração da velha ordem se insurgiram novas forças sociais que ganharam espaço com a Revolução Industrial e se inspiravam nos ideais da Revolução Francesa. A burguesia liberal, o proletariado e as camadas médias urbanas exigiam mais liberdade e, especialmente no caso do proletariado, reivindicava-se também mais igualdade.

A primeira onda revolucionária ocorreu entre 1820 e 1830, e foi marcada pela presença das ideias do liberalismo e do nacionalismo. Eram basicamente conspirações militares ou movimentos promovidos por organizações secretas que, na maior parte das vezes, foram sufocados pelas forças governamentais. Em Portugal, a Revolução Liberal do Porto (1820) resultou na aprovação da primeira Constituição Portuguesa (1822). Por sua vez, os nacionalistas gregos conseguiram, no ano de 1829, libertar a Grécia do domínio do Império Otomano, que desde o século XV controlava a região.

A partir de 1830 ocorreu a segunda onda revolucionária, que provocou um impacto imediato nas monarquias europeias. Na França, ocorreu a queda de Carlos X, fato que marcou a derrocada dos Bourbon e estimulou revoltas em várias regiões europeias. Com a ajuda dos ingleses, a Bélgica libertou-se da Holanda em 1830. Por sua vez, na Polônia irrompeu uma revolta nacionalista que logo foi abafada pelo governo russo. Já na península itálica, ocorreram levantes liberais e nacionalistas contra a dominação austríaca.

Na década de 1840, a Europa viveu a terceira onda revolucionária. A partir de 1845, houve uma sucessão de más colheitas no campo, enquanto que nas cidades a fome e o desemprego tornavam cada vez mais difícil a vida das camadas mais pobres da população. Em 1846, na Galícia austríaca (região que hoje é pertencente em parte à Polônia e em parte à Ucrânia), em uma só noite o povo enfurecido assassinou cerca de mil aristocratas. Na França, em fevereiro de 1848, manifestações populares em Paris e combates de rua levaram à abdicação do rei Luís Filipe e à proclamação da Segunda República (a Primeira havia sido entre 1792 e 1804). Em Berlim, na Prússia, entre março e abril de 1848, operários e burgueses entraram em conflito com tropas do governo, obrigando o rei Frederico Guilherme IV a convocar eleições para uma Assembleia Constituinte. Movimentos semelhantes ocorreram em outras partes da Europa. Esta terceira onda revolucionária teve um caráter internacional e ficou conhecida como a Primavera dos Povos.


A Inglaterra no século XIX

No início do século XIX, a Inglaterra consolidou-se como a principal potência mundial, situação que vigoraria até o início do século XX. O trono inglês foi ocupado por mais de 60 anos (1837-1901) pela rainha Vitória. Tal período da história inglesa ficaria conhecido como a Era Vitoriana, e foi marcado por uma política burguesa impulsionadora do liberalismo. O rápido crescimento industrial, a poderosa marinha mercante e o Estado solidamente estruturado garantiram o poderio britânico, que não encontrava rivais à altura. Naquela época, a libra esterlina era a moeda do comércio internacional.

Durante o período vitoriano, ocorreram também conquistas trabalhistas. Organizações de trabalhadores como as trade unions venceram a resistência do empresariado e obtiveram sucessivas melhorias nas condições de trabalho. Houve o estabelecimento de uma legislação trabalhista, a redução da jornada de trabalho e o aumento dos salários, bem como a conquista de um maior espaço na vida política inglesa por parte dos trabalhadores. Em 1838, operários ingleses enviaram uma petição intitulada Carta do Povo ao Parlamento, reivindicando o sufrágio universal, o voto secreto, o fim do critério censitário para votar e ser votado, a remuneração dos eleitos e eleições anuais. O documento, embora tenha sido rejeitado pelo Parlamento, acabou inspirando o movimento cartista, que pressionou os governos e obteve algumas conquistas, tais como a regulamentação do trabalho infantil e feminino, a permissão de associações políticas e a jornada de trabalho de 10 horas.

Anos mais tarde, movimentos populares retomaram a sua força e conquistaram, em 1858, o fim do censo eleitoral para a Câmara dos Comuns e, em 1867, a ampliação do direito de voto, deixando ainda de fora os trabalhadores industriais mais pobres. Tempos depois, estabeleceu-se o voto secreto e o direito de voto aos trabalhadores rurais. Os sindicatos foram oficialmente reconhecidos no final dos anos 1880, quando a duração da jornada de trabalho de adultos (homens e mulheres) e crianças foi finalmente regulamentada. Em 1893, formou-se o Partido Trabalhista a partir da ação de líderes sindicais. O sufrágio universal foi estabelecido na Inglaterra em 1918.


A França no século XIX

Na França, a queda de Napoleão Bonaparte em 1815 levou à coroação de Luís XVIII como o novo rei francês. Luís XVIII era irmão de Luís XVI, que havia sido guilhotinado na Revolução Francesa. Uma nova Constituição restabeleceu um governo elitista, combinando o absolutismo com um aparente liberalismo, voto censitário e cerceamento dos direitos e da liberdade conquistados durante a Revolução Francesa.

O sucessor de Luís XVIII foi Carlos X, que governou entre 1824 e 1830. Carlos X restabeleceu os moldes de um governo centralizado, transferiu o ensino para o poder eclesiástico e restaurou privilégios do clero e da nobreza. Liderados pelo duque Luís Filipe de Orléans e pela imprensa, os liberais passaram a fazer uma forte oposição a Carlos X. Os liberais defendiam um Estado constitucional, o direito de voto e as liberdades individuais, conquistando a maioria das cadeiras da Câmara dos Deputados em 1828. As tensões entre o Parlamento e a monarquia se intensificaram, e os liberais mobilizaram a sociedade, preparando o terreno para a Revolução de 1830. Nesse ano, Carlos X decidiu suprimir a liberdade de imprensa, e o povo realizou levantes e fez barricadas nas ruas de Paris, exigindo mudanças. Carlos X estabeleceu a censura completa, dissolveu a Câmara dos Deputados e reformulou a lei eleitoral, com a intenção de fortalecer a participação política dos setores aristocráticos. Trabalhadores urbanos, estudantes, pequenos e médios comerciantes, industriais e banqueiros reagiram, rebelando-se contra o monarca em julho de 1830. Pressionado, o rei abdicou do trono e exilou-se na Inglaterra.

A Revolução de 1830 significou o fim das expectativas restauradoras do Congresso de Viena e inspirou diversos movimentos que abalariam a Europa nos anos seguintes, como as revoluções de 1848 e movimentos nacionalistas. Com o fim da dinastia Bourbon, Luís Filipe de Orléans subiu ao trono na França. O novo rei seria conhecido como o “rei burguês” ou o “rei das barricadas”, pois foi apoiado pela burguesia francesa após liderar os levantes com barricadas nas ruas de Paris. Este avanço liberal repercutiu em toda a Europa, inspirando o nacionalismo na Bélgica, que se proclamaria independente dos Países Baixos, bem como na Polônia e na região das atuais Alemanha e Itália.

Luís Filipe reformou a Constituição, enfatizando o liberalismo. O rei submeteu-se à Constituição, fortaleceu o Legislativo, aboliu a censura e determinou que a religião católica deixasse de ser a religião oficial do país. Todavia, foi mantido o limite censitário para o voto e para a candidatura a cargos legislativos, atendendo assim aos interesses da burguesia e ignorando os do proletariado.

Os operários e as massas urbanas em geral enfrentavam a falta de direitos civis e as péssimas condições de vida e de trabalho, além do desemprego. Em fevereiro de 1848, iniciou-se um movimento revolucionário com intensa mobilização popular e operária e com a adesão da Guarda Nacional. Tal movimento forçou Luís Filipe a abdicar e, assim como o seu antecessor, refugiar-se na Inglaterra. Este movimento francês inspirou movimentos parecidos na Europa central e oriental, onde as massas populares desencadearam uma série de levantes que ficariam conhecidos como a Primavera dos Povos.

Após a derrubada de Luís Filipe, estabeleceu-se o sistema republicano. O novo governo proclamou o fim da pena de morte e o estabelecimento do sufrágio universal nas eleições. Todavia, afloraram os conflitos entre operários e burgueses. Os socialistas lutavam por medidas que gerassem empregos, pelo direito de greve e pela limitação das jornadas de trabalho. Eles até conseguiram alguns avanços, mas eram combatidos pelos liberais moderados que temiam que houvesse uma radicalização, tal como ocorrera na Revolução Francesa.

O governo provisório instalado no lugar de Luís Filipe elegeu deputados para elaborarem uma nova Constituição para a França em 1848. Nestas eleições, os moderados saíram vitoriosos e foram apoiados por proprietários rurais, o que aumentou a polarização política entre socialistas e burgueses. Novas manifestações populares ocorreram em Paris. O governo reagiu com violência, suspendendo os direitos individuais e massacrando a revolta, com mais de 3 mil fuzilamentos e 15 mil deportações.

A nova Constituição determinou que o Poder Legislativo caberia a uma Assembleia eleita por sufrágio universal por três anos, enquanto que o Poder Executivo ficaria a cargo de um Presidente eleito por quatro anos. Em dezembro de 1848, foi eleito presidente Luís Bonaparte, sobrinho de Napoleão I. Os franceses viam em Luís Bonaparte a chance de voltar à glória da época do Império. O novo governante buscou unir e pacificar o país. Em 1851, para perpetuar-se no poder, ele fechou a Assembleia e estabeleceu uma ditadura. Tal golpe ficaria conhecido como o 18 Brumário de Luís Bonaparte, em referência ao golpe que deu início à Era Napoleônica.

Por meio de um plebiscito, Luís Bonaparte ganhou poderes para elaborar uma nova Constituição e se tornar cônsul, tal como seu tio anos antes. Em seguida, um novo plebiscito transformou a França novamente em império, e Luís Bonaparte tornou-se imperador com o título de Napoleão III. O Poder Legislativo e as forças de oposição foram marginalizados enquanto a França se modernizava e desenvolvia-se economicamente. Paris foi reformada com a construção de parques, bulevares e prédios elegantes, sendo usada como sede de exposições internacionais que divulgavam o progresso cultural e industrial.

A partir de 1860, pressões liberais obrigaram o imperador a conceder liberdade de imprensa e ampliar os poderes da Assembleia Nacional. A política externa de Napoleão III era ambígua, pois enquanto defendia a “política das nacionalidades” – princípio segundo o qual cada nação deveria ter seu próprio país –, tentava impor seu domínio a outros países. Rivalidades com a Rússia fizeram a França e a Inglaterra aliarem-se ao Império Turco Otomano. Para defender o comércio francês na América e conter a hegemonia norte-americana no outro lado do Atlântico, Napoleão III envolveu-se em uma guerra no México (1862-1867). A França ainda enfrentou a Prússia, que liderava o processo de unificação da Alemanha. Napoleão III chegou a ser capturado pelos prussianos. Era o fim do chamado Segundo Império.

Após a queda de Napoleão III, foi proclamada a Terceira República Francesa. Este período foi marcado por conflitos políticos e sociais nos quais estiveram em disputa valores nacionais, monárquicos, republicanos, liberais e socialistas. Em março de 1871 foi proclamado um governo autônomo, a Comuna de Paris. Formada por dezenas de membros de várias tendências políticas radicais, a Comuna era a administração municipal eleita pelo povo. O serviço militar obrigatório foi abolido, estabeleceu-se que a Guarda Nacional passaria a ser formada por todos os cidadãos parisienses, os decretos de Versalhes foram declarados nulos e foi determinado que todas as cidades da França passariam a contar com autonomia municipal. A Comuna durou 72 dias e praticou uma política de inspiração socialista, proclamando a igualdade civil de homens e mulheres, suprimindo o trabalho noturno e criando pensões para viúvas e órfãos. Foi uma experiência de autogestão democrática e popular.

A Terceira República derrotou violentamente a Comuna de Paris. Mais de 20 mil pessoas morreram, enquanto outras 70 mil foram enviadas para a Guiana Francesa. A Terceira República sobreviveu até 1940, quando a França foi invadida por Adolf Hitler durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).


A Formação da Itália

A Itália como conhecemos hoje ainda não existia no início do século XIX. A península itálica era dividida em vários reinos e ducados. Muitos desses pequenos Estados estavam sob o domínio da Áustria. Os precursores do movimento pela unificação da Itália foram os carbonários (nome que está associado às cabanas dos carvoeiros, onde ocorriam reuniões secretas), que reuniram monarquistas e republicanos que atuavam em várias partes da península.

Sob a inspiração dos movimentos liberais e nacionalistas que ocorriam em várias partes da Europa a partir de 1848, amplos setores da população passaram a se mobilizar para expulsar os austríacos e reunir todos os reinos e ducados da região em um único e novo país. Os republicanos, liderados por Mazzini e Giuseppe Garibaldi, e os monarquistas, liderados pelo conde Cavour, se destacaram neste processo.

Em 1859, o reino do Piemonte-Sardenha – um Estado independente, industrializado e progressista, governado por Vítor Emanuel II – entrou em guerra contra a Áustria. As tropas piemontesas contaram com a ajuda do exército francês e dos camisas vermelhas, um corpo de voluntários republicanos liderados por Giuseppe Garibaldi. O reino do Piemonte-Sardenha venceu o conflito e, em seguida, ampliou o seu território, anexando novos ducados e parte dos Estados Pontifícios. Em setembro de 1860, Garibaldi e seus camisas vermelhas ocuparam o Reino de Nápoles. Garibaldi e seus homens também conquistaram Parma, Módena, Toscana, parte dos Estados Pontifícios, a Sicília e o sul da Itália.  No ano seguinte, foi eleito o primeiro parlamento italiano, que reconheceu o rei Vitor Emanuel II (1820-1878), do Piemonte-Sardenha, como o rei da Itália. Vítor Emanuel II foi favorecido pela decisão de Garibaldi de abandonar a política para não dividir as forças italianas de unificação. O novo país anexou Veneza em 1866, bem como o restante dos Estados Pontifícios, incluindo Roma, em 1870. Todavia, o Papa Pio IX recusou-se a reconhecer o novo Estado, refugiando-se no Vaticano – o bairro de Roma onde se encontra a Basílica de São Pedro. Foi apenas no ano de 1929, já no papado de Pio XI, que tal impasse foi resolvido por meio do Tratado de Latrão, um acordo que criou o Estado do Vaticano pertencente à Igreja Católica e chefiado pelo Papa.

As províncias setentrionais do Tirol, Trentino e Ístria, de população predominantemente italiana e em mãos dos austríacos, ficaram conhecidas como as províncias irredentas (não libertadas) e eram reivindicadas pela Itália. A disputa pelo domínio dessas províncias seria uma das razões que fariam a Itália entrar na Primeira Guerra Mundial.


A Formação da Alemanha

Assim como a Itália, a Alemanha ainda não existia como país unificado no início do século XIX. Durante o Congresso de Viena, a Confederação do Reno foi substituída pela Confederação Germânica, bloco formado por 39 Estados, dos quais os mais importantes eram a Prússia (desenvolvida comercial e industrialmente) e a Áustria (de economia basicamente agrária). Em 1834, as barreiras aduaneiras entre estes Estados foram eliminadas. A união econômica dinamizou o capitalismo na região, mas, como a Prússia deixou a Áustria de fora, os austríacos ameaçaram iniciar uma guerra, o que fez a Prússia recuar. O Império Austríaco recuperava assim a sua supremacia na Confederação Germânica.

Tempos depois, por volta de 1860, a Prússia iniciou um programa de modernização militar sustentado pela aliança da alta burguesia com os grandes proprietários e aristocratas. O chanceler (primeiro-ministro) da Prússia, Otto von Bismarck (1815-1898), defendia a unificação dos Estados Germânicos a partir de uma estratégia que visava a exaltação do espírito nacionalista por meio da participação em guerras. Após vencer a Áustria na Guerra das Sete Semanas (1866) e anexar ducados germânicos que estavam em poder de outros países, o governo de Bismarck promoveu uma reforma. A Confederação Germânica foi extinta e, em seu lugar, criou-se a Confederação Germânica do Norte, formada pela Prússia e pelos Estados germânicos setentrionais e liderada pelo kaiser Guilherme I, de quem Bismarck era ministro.

Tal acontecimento deixou o governo da França em alerta, pois os franceses consideravam que a política de Bismarck ameaçava o equilíbrio de forças na Europa. Napoleão III opunha-se à unificação alemã pois ela faria surgir uma grande potência em suas fronteiras orientais. A França exigiu que os Estados germânicos do sul não se integrassem à nova Confederação, ameaçando atacá-los caso eles não obedecessem. Em julho de 1870, França e Prússia entraram em guerra. O conflito foi vencido pelos prussianos, que eram militarmente superiores.

Em janeiro de 1871, em pleno palácio de Versalhes – situado nas vizinhanças da capital francesa –, Bismarck proclamou o II Reich (Segundo Reino) da Alemanha unificada, sob o governo do kaiser (rei) Guilherme I. A derrota na Guerra Franco-Prussiana, como o conflito ficou conhecido, teve um alto custo para os franceses. O Tratado de Frankfurt estabeleceu que, além de pagar uma indenização de 5 bilhões de francos, a França deveria ceder à Alemanha as regiões da Alsácia e da Lorena.[1] Com a unificação, a Alemanha desenvolveu-se intensamente, a ponto de, em 1900, superar a Inglaterra na produção de aço. O desenvolvimento industrial alemão colocou em risco a hegemonia britânica mundial, gerando atritos. A exigência alemã de uma redivisão colonial que a favorecesse, somada às alianças político-militares, ocasionaria a Primeira Guerra Mundial. [2]





[1] A perda das duas regiões estaria entre as motivações da França para participar da Primeira Guerra Mundial (1914-1918).
[2] Enquanto a Prússia liderou o processo de unificação da Alemanha, a Áustria uniu-se à Hungria para formar o Império Austro-Húngaro. Áustria e Hungria continuavam, cada uma, com suas constituições e parlamentos próprios, enquanto o Poder Executivo era exercido por um único soberano, que era auxiliado por ministros oriundos dos dois países. Interessado em manter seus domínios na península Balcânica, em 1879, o Império Austro-Húngaro aliou-se à Alemanha e, anos mais tarde, à Itália, dando origem à Tríplice Aliança, que teria participação importante nos acontecimentos que levariam à Primeira Guerra Mundial.