Sobre o "Blog do Super Rodrigão"

*** O "Blog do Super Rodrigão" foi criado e editado por Rodrigo Francisco Dias quando de sua passagem como professor de História da Escola Estadual Messias Pedreiro (Uberlândia-MG). O Blog esteve ativo entre os anos de 2013 e 2018, mas as suas atividades foram encerradas no dia 27/08/2018, após o professor Rodrigo deixar a E. E. Messias Pedreiro. ***

domingo, 27 de julho de 2014

A Formação das Monarquias Centralizadas Europeias

As estruturas feudais eram um obstáculo ao desenvolvimento comercial e urbano na Europa. Os vários feudos e os seus poderes locais atrapalhavam o comércio, pois os senhores feudais interferiam na atividade comercial cobrando impostos dos mercadores. Ademais, por conta da fragmentação política não havia na Europa uniformidade territorial de leis, unidade monetária legal ou mesmo de pesos e medidas, algo que atrapalhava as transações comerciais.

A partir disso, comerciantes, artesãos e banqueiros passaram a defender a existência de um poder centralizado que se colocasse acima dos poderes locais, impusesse normas e também facilitasse o comércio. Essa burguesia europeia acabou contribuindo para a formação de um exército mercenário a serviço do Estado, uma força militar que tinha como finalidade garantir a autoridade do monarca. A ideia de centralização política também agradou aos reis europeus, que desejavam se sobrepor à nobreza e limitar o poder da Igreja.

A formação das monarquias centralizadas europeias, portanto, foi fruto da comunhão de interesses entre reis e burgueses. Por sua vez, a nobreza também acabou se beneficiando deste processo, pois o exército do rei garantia a ordem contra as rebeliões rurais e mantinha boa parte dos privilégios feudais.

Espanha e Portugal

A Península Ibérica foi povoada por iberos, celtas, lígures, visigodos e árabes, estes últimos que lá chegaram no século VIII. A formação dos Estados centralizados na região está vinculada à Guerra de Reconquista dos territórios ocupados por muçulmanos. Foi graças à presença árabe que a religião islâmica chegou até a Península Ibérica, onde o cristianismo já se fazia presente. Reinos cristãos independentes foram mantidos no norte da península, na região montanhosa das Astúrias, e foi dali que partiu o movimento da Reconquista a partir do século XI.

Durante a Reconquista, formaram-se os reinos de Leão, Navarra, Castela e Aragão. Os dois últimos anexaram os outros e, em 1469, se uniram por meio do casamento entre Fernando de Aragão e Isabel de Castela. Fernando e Isabel ficariam conhecidos como os “Reis Católicos” e a união dos dois originou o Estado centralizado espanhol. A conquista de Granada, último reduto árabe no sul da península, e a consequente expulsão dos mouros marcaram a consolidação do Estado espanhol, em 1492.

Já a origem de Portugal remonta ao episódio da doação do Condado Portucalense feita pelo rei Afonso VI de Leão a Henrique de Borgonha, este último sendo um nobre francês participante da Guerra de Reconquista. A doação daquelas terras estava atrelada ao casamento entre Henrique de Borgonha e dona Teresa, filha ilegítima do rei. Em 1139, após disputas familiares, Portugal tornou-se independente de Leão, quando dom Afonso Henriques, o filho de Teresa e Henrique, expulsou a própria mãe do lugar porque ela defendia a sujeição do Condado Portucalense ao Reino de Leão.

A partir daquele momento iniciou-se a Dinastia de Borgonha (1139-1383), que continuou a guerra contra os muçulmanos e expandiu as fronteiras do reino para o sul. Com a expansão territorial, áreas eram doadas à nobreza guerreira, mas esses nobres não ganhavam a posse hereditária das terras. Em Portugal, portanto, a hegemonia da autoridade real foi mantida, enquanto a formação de uma nobreza proprietária e autônoma não foi consolidada.

Com a transformação de Portugal em escala da rota marítima que ligava o mar Mediterrâneo ao norte da Europa, houve a consolidação do setor mercantil da sociedade portuguesa. A partir do século XIV, as guerras e a peste negra abalaram o continente europeu, aumentando a insegurança de rotas comerciais terrestres, o que fez com que a rota marítima que passava por Portugal ganhasse mais importância.

Em 1383, morreu Fernando I, o último rei da Dinastia de Borgonha, que não deixou herdeiros diretos. Houve então uma intensa disputa sucessória, pois parte da nobreza apoiava a entrega da Coroa portuguesa ao genro de dom Fernando, o rei de Castela, enquanto os comerciantes e setores populares queriam que dom João, mestre de Avis, subisse ao trono. Foi a chamada Revolução de Avis, e em 1385, na Batalha de Aljubarrota, as tropas castelhanas foram derrotadas. Dom João ascendeu ao trono e iniciou a Dinastia de Avis.

Com a nova dinastia, os interesses da monarquia e os do setor mercantil se aproximaram, pois os comerciantes queriam ampliar seus mercados e o rei queria fortalecer-se no poder por meio da cobrança de impostos. Tal aliança desencadearia a expansão marítima portuguesa a partir do século XV.

O reino francês

A Dinastia Capetíngia (987-1328), fundada por Hugo Capeto, atuou na centralização do reino francês. Um dos reis dessa dinastia foi Filipe Augusto, ou Filipe II (1180-1223), que iniciou o processo centralizador ao cobrar impostos em todo o território francês e montar um poderoso exército para garantir o seu poder. Filipe II usou como pretexto para realizar tais ações a necessidade de combater os ingleses que ocupavam o norte da França. A antiga monarquia feudal, centrada nos feudos e marcada pela atuação de suseranos e vassalos locais, dava lugar a um Estado centralizado.

Após vencer os ingleses, Filipe II consolidou o seu poder por meio da força militar, da cobrança de impostos realizada por fiscais por ele nomeados e da imposição da justiça real sobre as leis dos nobres locais. O monarca aliou-se à burguesia vendendo Cartas de Franquia aos burgos que quisessem autonomia em relação aos senhores feudais. Já para os nobres territoriais a força monárquica serviu para garantir os privilégios da nobreza e manter a ordem e a subordinação servil.

Luís IX, cujo reinado durou de 1226 a 1270, deu continuidade ao processo de centralização por meio de uma rede de tribunais e da instituição de uma moeda de circulação nacional. Tendo participado da Sétima e da Oitava Cruzadas, falecendo nesta última, foi canonizado pela Igreja católica como São Luís.

Ao herdar um Estado já fortalecido, Filipe IV, o Belo, cujo reinado durou de 1285 a 1314, procurou legitimar o seu poder criando a assembleia dos Estados Gerais, em 1302, sob o primado da soberania real. Formada por membros do clero, da nobreza e por comerciantes das cidades, a assembleia tinha um caráter apenas consultivo e só era convocada quando o monarca queria. Representantes das camadas mais pobres da sociedade francesa não participavam da assembleia.

Com o apoio da assembleia, Filipe IV taxou os bens da Igreja e o papa até o ameaçou de excomunhão. Com a morte do líder da Igreja católica em 1303, Filipe IV interferiu na escolha de seu sucessor, impondo o nome de um francês que viria a ser o papa Clemente V. Além disso, o rei francês forçou a transferência da sede da Igreja de Roma para a cidade de Avignon, no sul da França, em um episódio que ficou conhecido como o Cativeiro de Avignon. Durante setenta anos os papas ficaram submetidos à autoridade do rei da França. Quando outro papa foi nomeado em Roma durante o mesmo período, ocorreu o Cisma do Ocidente que dividiu a autoridade da Igreja católica, que superaria tal situação apenas no século XV.

O fortalecimento do poder monárquico francês foi suspenso com a Guerra dos Cem Anos (1337-1453). Necessitando da nobreza para fortalecer o exército, a monarquia francesa teve de fazer concessões aos nobres. Ademais, a fome, a peste negra e a insatisfação da burguesia com as primeiras derrotas no confronto também colaboraram para o enfraquecimento da monarquia francesa. Eclodiram então as “jacqueries”, rebeliões camponesas como a ocorrida em 1358, quando castelos foram invadidos e senhores foram mortos. Essas rebeliões foram reprimidas pelo Estado e pela nobreza.

Vitórias militares decisivas na Guerra dos Cem Anos vieram apenas no século XV, quando um grande levante popular se voltou contra os ingleses. Joana d’Arc, filha de camponeses humildes que se dizia enviada por Deus para guiar os franceses na expulsão do exército inglês, participou ativamente das lutas e teve um papel importante na resistência francesa à Inglaterra. Ela levou Carlos VII a ser coroado em Reims, conforme as antigas tradições dos francos, mas em 1430 foi capturada e acabou acusada de heresia e condenada à morte por um tribunal eclesiástico.

Os franceses conseguiram expulsar definitivamente os ingleses apenas em 1453, quando terminou a Guerra dos Cem Anos.

O reino inglês

No início do período medieval, a Grã-Bretanha foi ocupada por anglos e saxões. Como o rei anglo-saxão Eduardo, o Confessor (1042-1066), não deixou filhos herdeiros, houve uma disputa pelo trono. Em 1066, normandos vindos do norte da atual França invadiram a ilha e, sob a liderança de Guilherme, o Conquistador (primo de Eduardo), derrotaram os anglo-saxões na Batalha de Hastings, dando início à Dinastia Normanda. Desenvolveu-se um sistema administrativo para cobrança de impostos e um forte exército foi criado. Guilherme (1066-1087) dividiu o reino em condados, os “shires”, controlados pela nobreza e fiscalizados por funcionários chamados “sheriffs”.

Em 1154, a Dinastia Plantageneta substituiu a Dinastia Normanda quando Henrique II (1154-1189) subiu ao trono. Os monarcas da Dinastia Plantageneta estabeleceram a justiça real e o “Common Law”, um conjunto de leis que deveria ser aplicado em todo o território.

Ricardo I, ou Ricardo Coração de Leão (1189-1199), foi o sucessor de Henrique II. Ricardo I se envolveu em guerras contra a França e participou da Terceira Cruzada, contribuindo com sua ausência para enfraquecer o poder real na Inglaterra. No reinado de João Sem-Terra (1199-1216), irmão de Ricardo, a insatisfação dos nobres com o rei atingiu o seu ponto máximo.

Guerreando contra a França, indispondo-se com o papa, elevando os impostos e tentando taxar os bens da Igreja, João Sem-Terra acabou tendo que enfrentar a revolta da nobreza, que lhe impôs a Magna Carta (1215). Segundo o documento, o monarca só poderia criar impostos ou alterar leis após a aprovação do Grande Conselho, órgão controlado por membros do clero e da nobreza.

Portanto, o processo de centralização política na Inglaterra foi retardado por meio dessa limitação ao poder real. Controlado por membros da velha ordem feudal, o Grande Conselho tinha um caráter conservador, e só aceitou a participação de burgueses em 1265.

Em decorrência da disputa de territórios no norte da Europa, como a próspera região têxtil de Flandres, a Inglaterra se envolveu na Guerra dos Cem Anos contra a França. Os ingleses obtiveram vitórias iniciais importantes, mas passaram a enfrentar alguns problemas, tais como a peste negra, as rebeliões camponesas (destacando-se o levante liderado por Wat Tyler e John Ball, em 1381) e o prolongamento da guerra. Neste quadro, houve o enfraquecimento da nobreza.


Com o fim da Guerra dos Cem Anos, já no século XV, começou uma disputa pela sucessão do trono inglês que afetaria ainda mais a nobreza: a Guerra das Duas Rosas (1455-1485), confronto entre as famílias York e Lancaster, fragilizou a nobreza e possibilitou a centralização política do país.