Sobre o "Blog do Super Rodrigão"

*** O "Blog do Super Rodrigão" foi criado e editado por Rodrigo Francisco Dias quando de sua passagem como professor de História da Escola Estadual Messias Pedreiro (Uberlândia-MG). O Blog esteve ativo entre os anos de 2013 e 2018, mas as suas atividades foram encerradas no dia 27/08/2018, após o professor Rodrigo deixar a E. E. Messias Pedreiro. ***

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

A Guerra de Secessão nos EUA (1861-1865)

- Divergências entre os estados do Norte e os estados do Sul.
Norte: industrialização, comércio...
Sul: agricultura, algodão, produção para exportação...

- Os estados do Norte defendiam a criação de taxas sobre produtos industrializados importados, pois queriam proteger a produção industrial norte-americana da concorrência com produtos estrangeiros. Por sua vez, os estados do Sul, muito ligados a compradores industriais e a bancos estrangeiros, defendiam o livre comércio e a concorrência entre as indústrias dos estados do Norte e as de outros países. É preciso lembrar que os habitantes do Sul apreciavam o luxo e produtos importados (muitas vezes de qualidade superior à dos produtos industrializados dos estados do Norte), e, por isso, não queriam que o preço das importações aumentasse.  

- A referida questão em torno das tarifas alfandegárias provocou o embate entre o poder central do governo federal e a autonomia de cada estado para definir a sua própria política econômica. Os estados do Sul  queriam uma maior autonomia para os estados. 

- A questão da escravidão. A constituição norte-americana e o direito à propriedade. A cultura do algodão nos estados do Sul: mão-de-obra servil e numerosa, muitos acreditavam que o trabalho na lavoura de algodão era coisa para negros escravizados. A escravidão era a pedra angular da economia sulista, bem como um elemento do modo de vida daquela região. 

"[...] a plantation não podia mais passar sem ela [a escravidão]. Sua supressão teria acarretado a fragmentação da propriedade, a ruína material dos fazendeiros e também o desmoronamento dessa sociedade que lhes parecia preservar valores de civilização superiores aos dos ianques [os norte-americanos dos estados do Norte]. O charme dessa sociedade elegante, hospitaleira, cultivada, dependia da conservação da escravatura. Assim, era por tudo o que lhes era caro - recordações da infância, tradições familiares, costumes sociais - que os sulistas achavam-se vinculados à escravocracia, cuja manutenção significava também a garantia de sua liberdade, o sinal de poderem conservar suas instituições particulares. Paradoxalmente, a perda definitiva da liberdade dos negros tornou-se símbolo da liberdade do Sul."
(RÉMOND, René. História dos Estados Unidos. Tradução de Álvaro Cabral. São Paulo: Martins Fontes, 1989, p. 58.)

- Campanha abolicionista no Norte contra as crueldades da escravidão. O romance A Cabana de Pai Tomás (1852), de Harriet Beecher-Stowe. Aqui, mais uma vez, surgiu o embate entre o poder central e a autonomia dos estados. Os sulistas defendiam que cada estado deveria decidir se mantinha a escravidão ou não. A Inglaterra aboliu a escravidão nas suas colônias em 1833, a França fez o mesmo em 1848. A discussão em torno da abolição aumenta cada vez mais. Com a expansão do território dos EUA (a "marcha para o Oeste"), os estados do Norte e os do Sul passaram a disputar pelo apoio dos novos estados que surgiam no Oeste. O Sul queria expandir o plantio de algodão (sistema plantation), já o Norte queria a expansão da agricultura livre. Embate entre dois modos de ver o mundo.

- Eleição do republicano Abraham Lincoln como presidente dos EUA em 1860. Lincoln defendia um poder central forte, tarifas protecionistas e se mostrava contrário à escravidão. Insatisfeita com a vitória de Lincoln, a Carolina do Sul declarou a sua separação da União em 20 de dezembro de 1860, sendo seguida por outros estados sulistas. Formação dos Estados Confederados da América, com capital em Richmond (Virgínia) e com Jefferson Davis como presidente. Em 1861, a artilharia sulista abriu fogo contra Fort Sumter, a fortaleza federal que protegia o porto de Charleston. INÍCIO DA GUERRA.

- Informações sobre os estados do Norte e os do Sul:
Norte - 23 estados (depois se tornaram 25), população de 22 milhões de pessoas, economia evoluída, indústrias, portos ativos, ferrovias, sistema bancário, recursos financeiros.
Sul - 11 estados, população de 9 milhões (incluídos os escravos) e economia agrícola.

- Apesar de tais dados apontarem uma vantagem para o Norte, os do Sul conseguiram forçar a continuidade da guerra por quatro anos. Como isso foi possível?
a) O Sul tomou a iniciativa do rompimento e das operações bélicas.
b) A convicção sulista de que se lutava pela própria existência (fator psicológico).
c) O Norte passou por disputas políticas internas.
d) O Sul mobilizou, já em 1862, o serviço militar obrigatório, valendo-se de todos os homens (jovens e velhos) disponíveis. O recrutamento no Norte só foi feito a partir de 1863, e mesmo assim muitos foram dispensados.
e) O Sul era uma sociedade rural e aristocrática, com uma facilidade maior para se tornar uma sociedade militar. Os sulistas, criados ao ar livre, praticando cavalgadas, deram ótimos soldados, com iniciativa e disciplina. Já os estados do Norte, que eram uma sociedade urbana, industrial e democrática, não tinham como formar uma sociedade militar tão rapidamente.

- Foi apenas com o passar do tempo que a vantagem numérica e as melhores condições de estrutura, somadas a uma melhoria na preparação para a guerra (que passou a ser feita), começaram a encaminhar a vitória dos estados do Norte sobre os do Sul. A indústria bélica dos estados do Norte também foi importante em tal processo.

- O Sul depois da Guerra: como o conflito se desenrolou no Sul, houve uma grande destruição naquela região. Tropas federais ocuparam o Sul durante anos, e governos foram impostos pelos estados do Norte. A economia tradicional e a aristocracia desapareceram, houve fragmentação dos latifúndios e dispersão da mão-de-obra. Como disse René Rémond, "uma sociedade morreu".

- Lincoln foi assassinado dias depois do fim da Guerra. A escravidão foi tornada ilegal nos EUA em 1865.

- Guerra de Secessão como um "marco" na história dos EUA.

"A Guerra de Secessão ocupa um lugar excepcionalmente importante na história dos Estados Unidos. [...] Sua importância não consiste apenas em ser um marco de referência. Ela divide efetivamente a história americana em duas épocas: encerra uma era e inaugura uma outra, que duraria pelo menos até a grande crise de 1929, se é que não se prolonga para além dela, ao menos em certos aspectos. A Guerra de Secessão ainda hoje divide os espíritos. Ocupa na consciência nacional um lugar superior até aos episódios da Independência, comparável somente à Revolução de 1789 para a opinião francesa. Tal como essa revolução continua sendo para os franceses um assunto de contradição, a luta do Norte contra o Sul nos Estados Unidos ainda é um tema de discórdia. O Sul evoca com nostalgia as lembranças de seu antigo esplendor; com o distanciamento no tempo, a lenda toma o lugar da verdade histórica; esse período exerce sobre os espíritos, os escritores, os próprios historiadores, um misterioso fascínio."
(RÉMOND, René. História dos Estados Unidos. Tradução de Álvaro Cabral. São Paulo: Martins Fontes, 1989, p. 63-64. Pensar que o livro de Rémond foi publicado, originalmente, em 1959... Pergunta a se fazer: como estava a questão racial nos EUA naquela época?)

Para pensar...

A questão racial nos EUA. Preconceito. O caso da região sul (forte racismo). Ressentimentos do sul a partir da derrota na guerra.

A Ku Klux Klan foi fundada em 24 de dezembro de 1865, no Tennessee. Racismo, violência, linchamentos, perseguições a negros. Os negros eram acusados de tudo (roubos, por exemplo) e sofriam ataques da KKK. A onda de violência provocou a reação do governo que tornou ilegal essa sociedade secreta. A KKK deixou alguns "herdeiros", que vez ou outra reapareceram (ainda aparecem?) nos EUA, conseguindo atrair pessoas para a sua "causa". Pensar no filme O Nascimento de uma Nação (1915, de D. W. Griffith). Leia aqui uma interessante matéria sobre a história da Ku Klux Klan.

A canção Strange Fruit, de Abel Meeropol, gravada pela cantora de jazz Billie Holiday em 1939:

"Árvores do sul produzem uma fruta estranha,
Sangue nas folhas e sangue nas raízes,
Corpos negros balançando na brisa do sul,
Frutas estranhas penduradas nos álamos.

Cena pastoril do heróico sul,
Os olhos inchados e a boca torcida,
Perfume de magnólias, doce e fresco,
E de repente o cheiro de carne queimada.

Aqui está a fruta para os corvos puxarem,
Para a chuva colher, para o vento sugar,
Para o sol secar, para a árvore pingar,
Aqui está a estranha e amarga colheita"

A música foi composta a partir dos casos de negros que, após serem brutalmente assassinados, tinham seus corpos pendurados em árvores, como se fossem "estranhos frutos". Nos anos 1930 circulou uma famosa fotografia que mostra um desses casos:


Vale dizer que a foto acima foi tirada em Marion, estado de Indiana, que fica na parte mais ao norte dos EUA, e não no sul, o que nos faz pensar que, historicamente, a violência contra negros nos EUA não aconteceu apenas em uma única parte do país.

Ouça a canção Strange Fruit, na voz de Billie Holiday, clicando neste link.