A perseguição sofrida pelos judeus na Alemanha nazista é um tema bastante conhecido. De fato, muito já se escreveu sobre o Holocausto. E muitos foram os filmes que trataram do extermínio dos judeus na Alemanha sob o governo de Adolf Hitler. Mas os nazistas não perseguiam apenas judeus. Como pode ser visto na imagem abaixo, dissidentes políticos, criminosos, testemunhas de Jeová e outros grupos também sofriam com a violência imposta pelos adeptos do nazismo. Os judeus não foram os únicos a serem enviados aos campos de concentração.
Na imagem acima, além da suástica, vê-se os triângulos de identificação,
que eram usados para identificar o grupo ao qual pertencia o
prisioneiro do campo de concentração.
Entre os grupos perseguidos pelos nazistas, chama a atenção aquele identificado pelo triângulo rosa invertido, o dos homens homossexuais. Este é um assunto que ainda não é abordado com muitos detalhes em livros didáticos e, sendo assim, gostaríamos de sugerir aqui um filme que pode ser útil no estudo deste tema: o documentário LGBT Parágrafo 175, dirigido por Rob Epstein e Jeffrey Friedman, que foi lançado no ano 2000. O título do filme faz uma referência ao parágrafo/artigo de número 175 do Código Penal Alemão de 1871, que estabelecia o seguinte: "Um ato sexual antinatural entre pessoas de sexo masculino ou por humanos com animais é punível com a prisão e a perda dos direitos civis pode lhe ser imposta". Em outras palavras, a homossexualidade era vista como um crime na Alemanha desde o século XIX.
Qual terá sido então o modo como o nazismo lidou com os homossexuais? É a essa pergunta que Parágrafo 175 procura responder. Logo no início, o documentário nos informa que mais de 100.000 homens foram presos na Alemanha durante os anos do nazismo, acusados de serem homossexuais. Destes, entre 10 e 15 mil chegaram a ser enviados para campos de concentração, onde muitos morreram. Quando o filme foi produzido, apenas 10 dos sobreviventes ainda estavam vivos, e são os depoimentos de alguns destes homens que o documentário explora para investigar a perseguição sofrida pelos homossexuais durante o regime de Adolf Hitler.
Nos depoimentos presentes no filme é visível o desconforto sentido pelos entrevistados - todos idosos - ao lembrar de acontecimentos tão terríveis. O passado incomoda e lembrar dele dói - um dos entrevistados chega a chorar durante a sua fala -, todavia, é impossível esquecer o que aconteceu e seguir em frente como se nada tivesse ocorrido. Daí decorre a necessidade de narrar o trauma, por mais dolorosa que possa ser esta tarefa.
Para além da questão em torno da memória e do esquecimento na História, o filme Parágrafo 175 oferece uma série de elementos para se pensar como viviam os homossexuais na Alemanha da primeira metade do século XX. A Berlim dos anos 1920 é descrita como o "paraíso dos homossexuais", onde havia vários bares e bailes frequentados por gays e lésbicas, quando o artigo 175 do Código Penal Alemão era ignorado na prática por muitas pessoas. Assim, os entrevistados recordam aqueles anos anteriores ao nazismo, destacando suas primeiras experiências sexuais e seus primeiros relacionamentos amorosos em um ambiente de relativa liberdade. Todavia, com o advento do regime de Hitler na Alemanha, a situação dos homossexuais mudou. Começaram as perseguições, as prisões, os espancamentos e os assassinatos. Os nazistas fecharam bares e boates gays. A Juventude Hitlerista perseguia violentamente os homossexuais. Os homens judeus que também eram gays sofriam com uma dupla perseguição.
O documentário nos informa que a Gestapo chegou a criar um departamento para combater o "crime da homossexualidade". Vale salientar também as diferenças no tratamento da homossexualidade masculina e da homossexualidade feminina. Enquanto os homens gays eram vistos como portadores de uma doença contagiosa que precisava ser erradicada a todo custo, o lesbianismo era visto, por sua vez, como uma condição temporária e curável. Poucas lésbicas foram enviadas para os campos de concentração, em comparação ao número de homens homossexuais. Muitas mulheres lésbicas foram para o exílio, casaram-se com homens gays e até sumiram da vista pública. Nos campos de concentração, os homens gays eram agredidos, violentados, mortos e até usados em experiências científicas (alguns foram castrados).
O fim da Segunda Guerra Mundial e a derrocada do nazismo na Alemanha não melhoraram de imediato a situação dos homossexuais naquele país. Afinal, o artigo 175 continuou em vigor depois da guerra por mais alguns anos. No final do século XX, época da produção do filme Parágrafo 175, nenhum dos homossexuais perseguidos pelo nazismo que sobreviveram havia recebido ainda algum tipo de reconhecimento ou indenização.
O filme de Rob Epstein e Jeffrey Friedman nos permite pensar sobre um tema que nem sempre é tratado com a devida atenção pelos historiadores e, sobretudo, pelos professores de História da Educação Básica. Falar da perseguição sofrida pelos homossexuais durante o nazismo é importante porque nos instiga a pensar sobre até que ponto pode chegar a intolerância. Assim, Parágrafo 175 não é apenas um filme instigante, mas extremamente necessário para a nossa atualidade, uma vez que várias formas de preconceito ainda persistem. Recomendado.
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O site YouTube disponibiliza na íntegra o filme Parágrafo 175 (acesso no dia 14 de junho de 2015). Vale a pena assistir!