O
uso de imagens na pesquisa histórica tem sido uma prática recorrente em
trabalhos de vários historiadores. Pinturas, fotografias, cartazes e tantos
outros recursos imagéticos – quando tomados como documentos históricos – podem
auxiliar o historiador na compreensão de uma determinada época. Não se trata de
ver nesses materiais uma reprodução fiel da realidade, mas sim uma forma de
reinterpretar a própria realidade, muitas vezes nos revelando informações sobre
aqueles sujeitos que os produziram.
Um
ótimo exemplo de uso de imagens na pesquisa histórica pode ser visto no texto Gloriosa
conquista ou cruel destruição? A Grande Guerra (1914-1918) representada em
cartões-postais alemães e franceses, de autoria de Marco Antonio Stancik.
Nele, o autor analisa as imagens presentes nos anversos de cartões-postais
alemães e franceses produzidos durante a Primeira Guerra Mundial. Nas palavras
de Stancik, “incontáveis cartões-postais daquele período foram produzidos por
diferentes países envolvidos no conflito, estampando cenas de caráter
nitidamente belicoso. Ao fazê-lo não apenas contribuíam para manter o assunto
presente, como muitas vezes mostravam-se propensos a reafirmar a necessidade de
combater ao inimigo. Para tanto, tendiam a exibir divergentes interpretações
daquilo que vinha se passando, tanto na frente de combate, como no front doméstico, onde as mulheres
tiveram que substituir aos homens, tanto nas fábricas, como no campo”.
Stancik
faz questão de destacar ainda que os cartões-postais eram usados como “verdadeiras
armas de guerra, embora de aparência singela, por intermédio das quais, entre
outras finalidades, seus criadores empenhavam-se no sentido de estimular e
tornar possível o seu prosseguimento, mediante a intenção de obter não apenas a
adesão como ainda o convencimento de militares e civis, quando não o
desencorajamento dos inimigos”. É curioso perceber que os cartões-postais
tinham um conteúdo visivelmente “patriótico” e “belicoso”, onde o inimigo quase
sempre era representado de maneira negativa, ora como “cruel” e “insensível” ora
como “derrotado” e “impossibilitado” de vencer a guerra.
O
autor procura demonstrar em seu texto que, embora as situações retratadas nos
postais fossem reais, elas eram “representadas de forma intensamente simbólica,
prenhe de significados. Por isso, o que mais se destaca nos cartões-postais do
período não é necessariamente sua veracidade. Em seu lugar, esse ‘algo mais’ de
que se revestem todas as mensagens assim veiculadas revelam aspectos por vezes
pouco explorados daqueles longos e sangrentos quatro anos que inauguraram verdadeiramente
o conturbado século XX. Afinal, a despeito de sua enganosa aparência de
inocentes e despretensiosos souvenirs,
os postais inseriam-se assim no cotidiano daqueles que encontravam-se afetados
pela guerra. Ao fazê-lo, tomavam parte de lutas simbólicas, por intermédio das
quais militares e civis eram estimulados a prosseguirem lutando, ou talvez
fossem desmotivados por mensagens que intentavam convencê-los de que isso seria
impraticável. E nesse empreendimento elementos de destaque, ou mesmo pequenos
detalhes tornavam-se pronunciadamente significativos: um pickelhaube, como distintivo dos alemães, assim como o vermelho
intenso das calças usadas pela Infantaria francesa, ou um monumento como a
Torre Eiffel. Aspectos esses que tendiam a atrair a simpatia/veneração, ou a
aversão, conforme a origem daquele que os observasse”.