Muitos pesquisadores têm se dedicado a estudos sobre as relações entre História e Imagens. De fato, existem imagens que nos fazem pensar a respeito de uma série de questões ligadas a determinado momento da História. Quando o assunto é o Império Napoleônico, não há como não mencionarmos uma série de imagens que nos ajudam a entender o processo de ascensão e queda de Napoleão Bonaparte.
Tendo centralizado o poder em suas mãos, Bonaparte procurou controlar as críticas ao seu governo com base na experiência ocorrida durante a Revolução Francesa, quando as artes tiveram grande papel na desestabilização do Antigo Regime. Diversos escultores e pintores, no período napoleônico, retratavam temas ligados às conquistas do imperador e à mitologia greco-romana. Um destes artistas foi Jacques-Louis David (1748-1825), pintor oficial de Napoleão. Em seu famoso quadro intitulado Napoleão cruzando os Alpes (1801), David pintou Bonaparte como um herói solitário e invencível, que enfrenta o vento e o frio montado em seu cavalo branco. Com a mão direita, Napoleão aponta para a frente e para o alto, como se estivesse indicando um futuro de glórias. Alguns dos soldados de Bonaparte podem ser vistos ao fundo da imagem (Figura 1).
Figura 1 - Neste quadro todos os elementos que compõem o cenário colaboram para uma representação positiva de Bonaparte. O cavalo sobre o qual Napoleão está montado é forte, vigoroso e está em posição imponente, empinando. Em pose heroica, Bonaparte aparece usando uma roupa brilhante. A paisagem ao seu redor confere ao conjunto da obra uma atmosfera de grandeza.
É preciso dizer que Jacques-Louis David pertenceu ao clube dos jacobinos e sua arte serviu aos ideais republicanos. Com o fim da República, foi preso e se afastou da política. À época de Napoleão, retornou à cena artística como pintor oficial da corte. As formas simples e austeras do período revolucionário deram lugar à pompa e ao requinte da época do Império. Na obra Consagração do Imperador Napoleão e coroação da Imperatriz Josefine (1805-1807), David procurou fixar o exato momento em que Napoleão, de costas para o papa, está prestes a coroar sua esposa Josefina, que aguarda ajoelhada (Figura 2). Vale lembrar que, naquele dia 2 de dezembro de 1804, na catedral de Notre-Dame, em Paris, Napoleão tornou-se imperador dos franceses, tomando a coroa real das mãos do papa, que celebrava a cerimônia, e coroando a si mesmo.
Figura 2 - Neste quadro, o pintor Jacques-Louis David elaborou uma composição monumental que reúne mais de 200 figuras e foi inspirada na cena da Coroação de Maria de Médici, pintada por Peter Paul Rubens. No quadro de David, à direita do papa, aparece o cardeal Giovanni Caprara. À sua esquerda, o cônsul Charles-François Lebrun usando um manto roxo bordado a ouro, segurando na mão esquerda um bastão encimado pela águia imperial. À direita de Lebrun, o chanceler Jean-Jacques-Régis de Cambacérès, de perfil, segurando a mão da justiça, e ao lado dele, marechal Louis-Alexandre Berthier segurando a almofada com a esfera imperial. A distribuição dos personagens segue uma ordenação de importância, que é destacada pelas gradações de cor e luz. David distribuiu os grupos com jogo de luz e foco nas cenas principais, diminuindo até a escuridão à esquerda. Casal imperial, papa, cardeais e marechais estão em plena luz enquanto os cortesãos e os irmãos estão na sombra. Madame de La Rochefoucauld e Madame Lavalette, damas de honra, carregam o pesado manto da imperatriz.
Outra representação de Napoleão como imperador foi elaborada pelo pintor Jean-Auguste-Dominique Ingres (1780-1867). Datado de 1806, o quadro Napoleão I no trono imperial também mostrou Bonaparte de maneira magnífica (Figura 3).
Figura 3 - Neste quadro, Ingres retratou Napoleão como um ser quase divino, coberto por um manto de veludo e tendo a cabeça cingida por uma coroa de louros. O cetro, símbolo do poder imperial, está sendo segurado pela sua mão direita.
Imagens como as reproduzidas acima lograram êxito em representar Napoleão Bonaparte em todo o seu poder. De fato, o Império Napoleônico, em seu auge, dominou diversos territórios no continente europeu durante o início do século XIX. Todavia, o Império de Bonaparte não duraria para sempre e, sobretudo após os acontecimentos da "Campanha da Rússia", Bonaparte passaria a vivenciar um processo de declínio de seu poder político. Em 1848, vários anos após o fim do Império Napoleônico, o pintor Paul Delaroche (1797-1856) produziu um quadro intitulado Bonaparte cruzando os Alpes que mostra Napoleão de uma maneira bem diferente (Figura 4).
Figura 4 - No quadro de Delaroche, Napoleão aparece de maneira bem diferente se comparado ao modo como foi retratado por Jacques-Louis David na Figura 1. No quadro de 1848, o cavalo sobre o qual Bonaparte está montado é um animal fraco, em posição combalida. Napoleão está curvado, como se estivesse cansado, e veste uma roupa simples e amarrotada. A paisagem é opressiva, e nela temos a presença de pessoas a pé, em aparente dificuldade de locomoção. Delaroche pintou o seu quadro muitos anos após a deposição do imperador, quando seus opositores podiam exprimir-se livremente.
Como se vê, a partir das imagens acima é possível pensarmos sobre a ascensão e o fim do Império Napoleônico!