Sobre o "Blog do Super Rodrigão"

*** O "Blog do Super Rodrigão" foi criado e editado por Rodrigo Francisco Dias quando de sua passagem como professor de História da Escola Estadual Messias Pedreiro (Uberlândia-MG). O Blog esteve ativo entre os anos de 2013 e 2018, mas as suas atividades foram encerradas no dia 27/08/2018, após o professor Rodrigo deixar a E. E. Messias Pedreiro. ***

quinta-feira, 2 de julho de 2015

A Revolta de Vila Rica em versos de Cecília Meireles

Cecília Meireles (1901-1964) foi uma importante poetisa brasileira. Em 1953, ela lançou a obra Romanceiro da Inconfidência, uma coletânea de poemas que aborda a história de Minas Gerais do início do século XVII ao final do século XVIII. Entre os vários episódios narrados pela autora por meio de versos está a Revolta de Vila Rica, também conhecida como Revolta de Filipe dos Santos. 

Vale a pena conferir o modo como Cecília Meireles trata desta revolta ocorrida em 1720:

ROMANCE V OU DA DESTRUIÇÃO DE OURO PODRE

Dorme, meu menino, dorme,
que o mundo vai se acabar.
Vieram cavalos de fogo:
são do Conde de Assumar.
Pelo Arraial e Ouro Podre,
começa o incêndio a lavrar.

O Conde jurou no Carmo
não fazer mal a ninguém.
(Vede agora pelo morro
que palavra o Conde tem!
Casas, muros, gente aflita
no fogo ralando vêm!)

D. Pedro, de uma varanda,
viu desfazer-se o arraial.
Grande vilania, Conde,
comestes para teu mal.
Mas o que aguenta as coroas
é sempre a espada brutal.

Riqueza grande da terra,
quantos por ti morrerão!
(Vede as sombras dos soldados
entre pólvora e alcatrão!
Valha-nos Santa Ifigênia!
- E isto é ser povo cristão!)

Dorme, meu menino, dorme...
Dorme e não queiras sonhar.
Morreu Felipe dos Santos
e, por castigo exemplar,
Depois de morto na forca,
Mandaram-no esquartejar!

Cavalos a que o prenderam,
estremeciam de dó,
Por arrastarem seu corpo
Ensanguentado, no pó.
Há multidões para os vivos:
porém quem morre vai só.

Dentro do tempo há mais tempo,
e, na roca da ambição,
Vais-se preparando a teia
dos castigos que virão:
Há mais forcas, mais suplícios
para os netos da tradição.

Embaixo e em cima da terra,
o ouro um dia vai secar.
Toda vez que um justo grita,
um carrasco o vem calar.
Quem não presta fica vivo;
quem é bom, mandam matar.

Dorme, meu menino, dorme...
Fogo vai, fumaça vem...
Um vento de cinzas negras
levou tudo para além...
Dizem que o Conde se ria!
Mas, quem ri, chora também.

Quando um dia fores grande,
e passares por ali,
Dirás: “Morro da Queimada,
como foste, nunca vi;
Mas, só de te ver agora,
ponho-me a chorar por ti:

Por tuas casas caídas,
pelos teus negros quintais,
Pelos corações queimados
em labaredas fatais,
- Por essa cobiça de ouro
que ardeu nas minas gerais.”

Foi numa noite medonha,
numa noite sem perdão.
Dissera o Conde: “Estais livres.”
E deu ordem de prisão.
Isso, Dom Pedro de Almeida,
é o que faz qualquer vilão.

Dorme, meu menino, dorme...
Que fumo subiu pelo ar!
As ruas se misturaram,
tudo perdeu lugar.
Quem vos deu poder tamanho,
Senhor Conde de Assumar?

Jurisdição para tanto 
não tinha, Senhor, bem sei...
(Vede os pequenos tiranos
que mandam mais do que o Rei!
Onde a fonte do ouro corre,
apodrece a flor da Lei!)

Dorme, meu menino, dorme,
- que Deus te ensine a lição
dos que sofrem neste mundo
violência e perseguição.
Morreu Felipe dos Santos:
Outros, porém, nascerão.

Não há Conde, não há forca,
não há coroa real
Mais seguros que estas casas,
que estas pedras do arraial,
deste Arraial do Ouro Podre
que foi de Mestre Pascoal.